A vida só tem um sentido, e o único sentido que a vida tem é quando investimos nossa vida na vida dos outros, ou quando encarnamos a luta dos outros como se ela fosse nossa, a luta do coletivo. Esta é a lida do Promotor de Justiça: lutar pela construção contínua da cidadania e da justiça social. O compromisso primordial do Ministério Público é a transformação, com justiça, da realidade social.



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14 de março de 2013

Não Matarás - Não Mentirás

 
"MIZAEL JUROU PELA FILHA QUE NÃO MATOU MÉRCIA', PG. C10 DA FOLHA DE SÃO PAULO DE HOJE (14.03).
 
Questionam-me então, amigos e alunos: se jurou pela filha "deve" ser inocente?!...
 
Devolvo, imediatamente: está bem, mas e se ele estiver mentindo, a filha inocente - que nada tem a ver com a mentira do pai inescrupoloso - pagaria com a própria vida? Evidentemente que não.
 
Qual a pena para ela? Logicamente, nenhuma!
 
Aos que acreditam em Deus, sabe-se, Deus "tem critério", é Justo, um não paga pelo que o outro fez.
 
À luz do direito positivo, do mesmo modo, a pena não passa da pessoa do culpado, e nenhuma pena remanesceria a inocente filha....
 
Bem, se desta mentira nada remanesceria em pena para ela, perguntemos então, e para ele? Igualmente nada. Tem o direito positivo de mentir e já demonstrou não acreditar em Deus, pois se acreditasse não mataria, cuja hierarquia do mandamento "não matarás", sem dúvida faz sucumbir o "não mentirás...".
 
Pode mentir, e mente. Ademais, simples reflexão: o que nos impede a mentira não é nada mais que um dos três alicerces de nossa consciência: a) Temência a Deus, como pressuposto do "homo religiosus"; b) Temência às regras jurídicas, cuja ameaça de sanção pauta a consciência, como pressuposto do "homo juridicus"; c) Respeito à ética social, como pressuposto do "homo socialis".
 
Bem, quem mata, como se afirma ter matado, qual desses pilares suporta a consciência? Nenhum!
 
Portanto, se a violação maior -"não matarás"- ao tripé da consciência já foi operada, uma violação menor - "não mentirás" - exsurge com muito mais facilidade, mister quando se confia na impunidade outorgada pelo direito brasileiro (nos EUA, o réu mentiroso comete crime de perjúrio, sujeitando-se a outra pena); não se acredita em punição divina, pois nao se crê em Deus; e, a ética social é apenas uma referência disparatada, diversa do "gosto do freguês", vale dizer, para ele é piada.
 
Destarte, remanesce a mentira no caso, sem culpa, sem pejo, sem franzir de testa, sem pestanejar, sem...vergonha!
 
Mentira como técnica, apenas, para despertar nos incautos o sentimento de piedade, e, se lhes sobrar algo a pensar, despertar-lhes também a necessidade de estudarem...psicologia judiciária penal para entenderem que "réus mentem" (ilegítima) defesa própria.
 
Portanto, a pergunta de S. Exa., o Juiz presidente do Júri: "O Senhor está falando a verdade ou está mentindo?", é graciosa, e pode, e deve, inclusive prescindir de ser feita, já que a ela, invariavelmente, se responde com outra mentira.
 
Por Edilson Mougenot Bonfim, Procurador de Justiça (MPSP) e Doutor em Processo Penal, em sua página do facebook (aqui), hoje.

2 comentários:

Promotor de Justiça disse...

Condenado: http://g1.globo.com/globo-news/jornal-globo-news/videos/t/todos-os-videos/v/juiz-alega-que-mizael-mentiu-durante-julgamento/2459874/

Fernando M. Zaupa disse...

Caro César, perfeita a colocação do Edilson...
...a dosimetria está a desejar e, vale lembrar a todos, isso ocorre no país todo, graças ao Supremo Tribunal Federal em primeiro lugar, por 'dizer' que quase todos os requisitos do art. 59 do CP para aumento da pena base são inconstitucionais e, em seguida, pela esteira de decisões que seguem o Supremo.
Afinal, como já disse alguém que me fugiu à memória, o Supremo é o órgão que tem o direito de errar por último.
Abraços
Fernando Zaupa
MPMS

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O Ministério Público que queremos e estamos edificando, pois, com férrea determinação e invulgar coragem, não é um Ministério Público acomodado à sombra das estruturas dominantes, acovardado, dócil e complacente com os poderosos, e intransigente e implacável somente com os fracos e débeis. Não é um Ministério Público burocrático, distante, insensível, fechado e recolhido em gabinetes refrigerados. Mas é um Ministério Público vibrante, desbravador, destemido, valente, valoroso, sensível aos movimentos, anseios e necessidades da nação brasileira. É um Ministério Público que caminha lado a lado com o cidadão pacato e honesto, misturando a nossa gente, auscultando os seus anseios, na busca incessante de Justiça Social. É um Ministério Público inflamado de uma ira santa, de uma rebeldia cívica, de uma cólera ética, contra todas as formas de opressão e de injustiça, contra a corrupção e a improbidade, contra os desmandos administrativos, contra a exclusão e a indigência. Um implacável protetor dos valores mais caros da sociedade brasileira. (GIACÓIA, Gilberto. Ministério Público Vocacionado. Revista Justitia, MPSP/APMP, n. 197, jul.-dez. 2007)