A vida só tem um sentido, e o único sentido que a vida tem é quando investimos nossa vida na vida dos outros, ou quando encarnamos a luta dos outros como se ela fosse nossa, a luta do coletivo. Esta é a lida do Promotor de Justiça: lutar pela construção contínua da cidadania e da justiça social. O compromisso primordial do Ministério Público é a transformação, com justiça, da realidade social.



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7 de setembro de 2011

ACP: Legitimidade da Defensoria Pública

Sentença nº /2011-B – 5ª Vara – tipo C

Processo 28561-68.2011.4.01.3400

Ação Civil Pública

Defensoria Pública da União x União
 
SENTENÇA
1. RELATÓRIO

Trata-se de ação civil pública proposta pela DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO em face da UNIÃO, com pedido de liminar para que a União recolha o livro de língua portuguesa Por Uma Vida Melhor, de autoria de Heloísa Ramos, em colaboração com outros autores. 

Como pedido final, requer a confirmação da liminar e que a União seja proibida de adquirir novos exemplares do livro.

Em breve síntese, alega que o livro considera válido o uso da língua popular, mesmo com erros gramaticais, o que ocasiona prejuízo aos estudantes, que possuem direito à educação adequada. 

Inicial às fls. 03/25, com documentos.

O despacho de fl. 208 determinou oitiva preliminar da União.

A Defensoria Pública juntou novos documentos.

Às fls. 227/242, a União apresentou manifestação preliminar, juntando documentos.

À fl. 348, a União requereu a juntada de decisão de inquérito administrativo instaurado pelo Ministério Público Federal, que concluiu pela inexistência de irregularidades no livro didático objeto dos autos.

É o relatório.

2. FUNDAMENTAÇÃO

A legitimidade da Defensoria Pública para a propositura da ação civil pública não é ampla, pois a lei não poderia, por óbvio, alterar o perfil constitucional da nobilíssima instituição. 

De fato, tenho que a Constituição, ao instituir tanto o Ministério Público, quanto a Defensoria Pública, criou atribuições específicas para cada uma das instituições e as mesmas não se confundem.

O perfil constitucional da Defensoria está previsto no artigo 134 da Constituição:

Art. 134. A Defensoria Pública é instituição essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a orientação jurídica e a defesa, em todos os graus, dos necessitados, na forma do art. 5º, LXXIV.

Assim, à Defensoria Pública cabe o papel, que é da maior importância, de ser a defensora jurídica dos necessitados.

Já as atribuições do Ministério Público estão instituídas no artigo 129 da Constituição, dentre as quais destaco a prevista no inciso III, de promover a defesa de interesses difusos e coletivos:

Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público: 

(...)

III - promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos.

Assim, quando a Lei da Ação Civil Pública conferiu legitimidade ativa à Defensoria, ela não o fez para transformar a Defensoria Pública em um segundo Ministério Público, com risco de prejuízo às suas atividades próprias, mas para possibilitar-lhe a defesa coletiva dos necessitados.

E transformar a Defensoria Pública num segundo Ministério Público apenas prejudicaria a defesa dos necessitados, uma vez que é altamente provável que muitos de seus membros, sem verdadeira vocação para a nobre e difícil tarefa de defesa dos necessitados, tentassem se transformar, de fato, em membros do Ministério Público.

É bem verdade que a própria Constituição estabelece que a legitimidade do Ministério Público para as ações civis previstas no artigo 129 “não impede a de terceiros, nas mesmas hipóteses, segundo o disposto nesta Constituição e na lei”, mas isso não afasta o que acabo de expor, pois a ilegitimidade da Defensoria Pública não decorre de “invasão de competência” do Ministério Público, mas do fato de que a defesa de interesses difusos e coletivos em sentido estrito não se compatibiliza com o seu perfil constitucional.

A Defensoria Pública pode propor ações civis públicas e ações coletivas, mas essencialmente em relação a interesses individuais homogêneos de pessoas necessitadas, para usar a dicção do Código de Defesa do Consumidor.

No presente caso, o objetivo da ação seria tutelar não direitos dos necessitados, mas tutelar o direito da população estudantil de maneira geral, pelo que a Defensoria Pública não tem legitimidade, tratando-se de um direito a, em tese, ser tutelado pelo Ministério Público.

3. DISPOSITIVO

Ante o exposto, tendo em vista a ilegitimidade passiva da Defensoria Pública da União para a defesa de direito coletivo que não é apenas dos necessitados, com base no artigo 295, II, do Código de Processo Civil, INDEFIRO A PETIÇÃO INICIAL e, consequentemente, JULGO EXTINGO O FEITO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO, com base no artigo 267, I e VI, do mesmo CPC1.

Sem condenação em custas e honorários advocatícios, a teor dos artigos 17 e 18 da Lei nº 7.347/85.

Tendo em vista o disposto no § 1º do artigo 5º da Lei nº 7.347/85, inclua-se o Ministério Público entre aqueles a serem intimados da sentença (e eventuais atos subseqüentes).

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

Brasília, 26 de julho de 2011.

Paulo Ricardo de Souza Cruz
Juiz Federal Substituto da 5ª Vara

Um comentário:

Anônimo disse...

Essa sentença diz tudo! O papel da Defensoria Pública está no art. 134 da Carta Magna! Um problema semelhante está ocorrendo no Estado de Santa Catarina em que os Policias Militares estão usurpando a função da Polícia Civil, como por exemplo: instaurar TC; lavrar Boletim de Ocorrência.

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