- Declare a sua versão dos acontecimentos – determinou o juiz.
O escrivão, as mãos nas teclas, transcreveu as palavras do acusado, conhecido pela alcunha de "Parafuso", residente na cidade de Melo, maior de idade, estado civil solteiro, de profissão desempregado.
O acusado não negou sua responsabilidade no delito que lhe era imputado. Sim, ele havia estrangulado uma galinha que não era de sua propriedade. Alegou:
- Tive de matá-la. Fazia tempo que minha pança roncava.
E concluiu:
- Foi em legítima defesa, senhor juiz.
(GALEANO, Eduardo. Bocas do Tempo. Porto Alegre: L&PM, 2004, p. 238)
Um comentário:
Escrevendo um conto semelhante na imaginação, podemos entender a diferença que a chamada alcunha faz. O pobre ladrão atendendo pela alcunha de Parafuso era só o clássico ladrão de galinhas.
Imaginemos que em outra situação no mesmo país, um funcionário público pegasse um helicóptero da polícia militar para voar num curto trajeto até sua residência. Assim, além de infringir a Lei de Improbidade Administrativa, ele teria colocado em grave risco a vida de um cidadão comum ferido com traumatismo craniano e que deveria ter sido transportado para o hospital por esse mesmo helicóptero.
Qual seria a reação do juiz ao receber escoltado pela polícia para depor, o funcionário público José Ribamar Ferreira de Araújo Costa, mais conhecido pela alcunha de José Sarney?
Podemos deduzir claramente pelo que aconteceu no estado do Maranhão, que das duas uma: ou esse estado não tem polícia militar, nem juízes e nem promotores ou a alcunha de José Sarney tem mais poder que todos eles e suas corporações juntos.
O triste é que isso não é um conto de ficção. É a mais vergonhosa realidade dos dias de hoje.
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