A vida só tem um sentido, e o único sentido que a vida tem é quando investimos nossa vida na vida dos outros, ou quando encarnamos a luta dos outros como se ela fosse nossa, a luta do coletivo. Esta é a lida do Promotor de Justiça: lutar pela construção contínua da cidadania e da justiça social. O compromisso primordial do Ministério Público é a transformação, com justiça, da realidade social.



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23 de abril de 2009

Conclusão: Gilmar Mendes...


Prezado Nassif:

Ontem de manhã li a pauta de julgamentos do STF de quarta-feira e achei que, pela natureza dos assuntos a serem julgados, nada merecia acompanhamento. Nossa, que engano…

Há muitos olhares sobre tal episódio tão peculiar, que é mais um dos degraus na descida ao inferno do STF. Estamos todos perplexos com o que aconteceu. Por que uma sessão de julgamento de matéria administrativa descambou naquilo? Vou fazer a minha leitura.

Como leitor de acórdãos do STF eu venho há tempos observando como GM é deselegante no trato com os colegas. Ele interfere nos votos dos outros ministros, faz apartes, desqualifica os votos que estão sendo proferidos em sentido contrário ao que pensa, faz sarcasmo com as posições divergentes etc. Tudo como manda o figurino da truculência togada e letrada. Cada um reage a isso de acordo com o seu temperamento. Sabemos que um dos principais alvos do GM é o ministro Barbosa, por conta de episódios anteriores que são conhecidos.

Ontem GM fez isso novamente e alfinetou Joaquim insinuando que a) o ministro J. Barbosa desconhecia os dados do processo por negligência, já que faltaria demais às sessões; b) a informação solicitada por J. Barbosa não seria relevante para o julgamento do caso, por não interessar à solução técnica-jurídica.

Seria mais um evento de habitual descortesia do GM contra um desafeto que não lhe é submisso. Nada custaria ao presidente da sessão permitir o esclarecimento de um dos Ministros acerca da matéria que estava sob julgamento - pelo contrário, é dever de quem julga solicitar todos os esclarecimentos acerca do tema e debatê-los com os demais julgadores, pois essa é a essência do julgamento colegiado. Mas GM não iria perder a oportunidade de esculhambar o Min. Joaquim Barbosa, posando de superior em hierarquia e melhor informado que o Min. Barbosa, tudo ao vivo na TV Justiça com transmissão para todo o país.

Só que a reação do Min. Barbosa veio num ímpeto que misturou autodefesa com desabafo. Barbosa esclareceu que todos os afastamentos estavam justificados e autorizados pela corte e que era responsabilidade da Corte Constitucional saber as conseqüências integrais das decisões que adota, inclusive as sócio-econômicas. E Barbosa está com a razão, já que as cortes constitucionais, por também exercerem poder político (tese do próprio GM), devem receber as informações que um parlamento receberia sobre os impactos de suas decisões. Isso seria o suficiente.

A defesa passou ao contra-ataque e então Joaquim Barbosa disse com todas as letras o que pensava sobre a atuação midiática e comprometidade GM à frente do STF e quais as conseqüências disso para a reputação da Corte.

O principal responsável é o atual Presidente da Corte. GM merecia ouvir tudo aquilo. O seu “despotismo obscuro” , o personalismo, a egolatria na condução dos assuntos do Tribunal, tudo levou à certeza do diagnóstico proferido na sessão passada.

Mas não adiro ao entusiasmo dos comentaristas sobre o que aconteceu, pelo contrário. O Ministro Joaquim Barbosa devia ter tido um pouco mais de sangue frio. Esse descontrole era tudo o que GM precisava para se fazer de vítima e obter a “solidariedade” já conhecida das outras figurinhas da Corte e da mídia. Já estamos vendo movimento semelhante ao que ocorreu naquela sessão de “desagravo” após o HC de Dantas.Joaquim Barbosa ficará isolado na corte e sofrerá campanha pública de “desconstrução” de imagem.

Por outro lado, ficou muito evidente que não podemos ter Ministros do STF que sejam ao mesmo tempo professores de cursinho jurídico de propriedade de um Ministro. O constrangimento é dobrado.

Finalmente, a suspensão dos trabalhos de quinta-feira é uma coisa que não tem justificativa. A birra de GM e Joaquim Barbosa não é tão importante assim. Que todos voltem ao Plenário e continuem trabalhando como Ministros adultos e responsáveis pelos milhares de processos em tramitação do STF.

Veremos as cenas que ocorrerão a partir de hoje.

Perdoe a extensão da análise. Agradeço o espaço.


Professor



***


O jurista Dalmo de Abreu Dallari compara a uma "briga de moleques de rua" a atuação dos ministros do Supremo Tribunal Federal, Gilmar Mendes e Joaquim Barbosa. Mas analisa que "naturalmente", a responsabilidade maior é do presidente Gilmar Mendes:

- A culpa é grande do presidente Gilmar Mendes, é um exibicionismo exagerado, a busca dos holofotes, a busca da imprensa. Além da vocação autoritária do ministro Gilmar Mendes, que não é novidade. Ele realmente pratica no Supremo o coronelismo e isso é absolutamente errado. Mas o erro maior está neste excesso de vedetismo, excesso de publicidade.

Um comentário:

Vellker disse...

A briga entre o juiz Joaquim Barbosa e o juiz Gilmar Mendes nada mais é do que uma constatação pública do que não se pode mais esconder. Que o poder judiciário está com sua corte mais alta no mesmo caminho do poder legislativo, em outras palavras, no caminho de sua desagregação pública, porque a desagregação interna já ocorreu há muito tempo, à semelhança do poder que responde pelo apelido de congresso nacional.

Surpreendido pelo tom irado do juiz Joaquim Barbosa, Gilmar Mendes mal conseguiu esconder em seu rosto a expressão que se por uma lado era um sorriso que parecia tentar minimizar o que acontecia, em sua face se mostrava uma indesmentível contorção de nervosismo, eu diria até mesmo de medo, pois sabia que tudo estava sendo mostrado para milhares de pessoas ao vivo.

Responder à altura à palavra "capangas" seria arriscar-se a andar por terreno minado, pelo que ele preferiu minimizar a discussão. Que outras palavras o juiz Joaquim Barbosa poderia começar a fslar em voz alta alí, se provocado? Melhor não arriscar maiores danos pensou o juiz Gilmar.

Quem tem voz de autoridade e ao mesmo tempo se sabe assistido pela justiça e pela correção de seus atos, teria outra reação, no caso a de protestar com uma eloquência que faria honras a Rui Barbosa.

No entanto o que se viu foi um homem acuado pelas palavras de seu oponente, a repetir pateticamente o surrado bordão "Vossa Excelência me respeite" frase que no meio jurídico nesses casos já perdeu qualquer sentido.

Quanto aos seus aliados da mídia, tanto faz que isso tenha acontecido de forma a dar-lhes a chance de saírem em defesa do seu pretenso ídolo. Se ele tivesse tripudiado sobre a figura do juiz Joaquim Barbosa, sairiam da mesma forma a elogiar a "intrepidez" do seu deus de pés de barro.

Fica assim claro dia a dia, com as demonstrações públicas de desagregação contínua de valores e atitudes, como o poder judiciário e o poder legislativo, seu irmão político, tornam-se aos olhos de todos somente dois lamentáveis exemplos da lamentável política brasileira dos dias de hoje.

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O Ministério Público que queremos e estamos edificando, pois, com férrea determinação e invulgar coragem, não é um Ministério Público acomodado à sombra das estruturas dominantes, acovardado, dócil e complacente com os poderosos, e intransigente e implacável somente com os fracos e débeis. Não é um Ministério Público burocrático, distante, insensível, fechado e recolhido em gabinetes refrigerados. Mas é um Ministério Público vibrante, desbravador, destemido, valente, valoroso, sensível aos movimentos, anseios e necessidades da nação brasileira. É um Ministério Público que caminha lado a lado com o cidadão pacato e honesto, misturando a nossa gente, auscultando os seus anseios, na busca incessante de Justiça Social. É um Ministério Público inflamado de uma ira santa, de uma rebeldia cívica, de uma cólera ética, contra todas as formas de opressão e de injustiça, contra a corrupção e a improbidade, contra os desmandos administrativos, contra a exclusão e a indigência. Um implacável protetor dos valores mais caros da sociedade brasileira. (GIACÓIA, Gilberto. Ministério Público Vocacionado. Revista Justitia, MPSP/APMP, n. 197, jul.-dez. 2007)