Tramita na Câmara dos Deputados, em regime de urgência, o projeto de Lei n. 4.203/01, que altera os dispositivos do Código de Processo Penal relativos ao Tribunal do Júri. Aprovado no Senado (05/12/07), com emendas, o projeto retornou à casa de origem, onde já foi aprovado pela Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (11/03/08). Com a expectativa de aprovação no plenário e encaminhamento para sanção presidencial ainda este ano, convém a análise das principais alterações, tomando-se por norte o texto consolidado a partir do relatório já aprovado na CCJ da Câmara, a despeito de tratar-se de assunto de lege ferenda.
1. PRINCÍPIOS QUE INFORMAM O PROJETO
O texto se inspira em predicados de celeridade (direito do acusado ao julgamento em tempo razoável), eficiência (aproveitamento de recursos disponíveis e não-adiamento de atos processuais), simplicidade (instrumentalidade, oralidade e informalismo) e segurança (resposta judicial a demandas sociais).
2. PRINCIPAIS ALTERAÇÕES
2.1. DA ACUSAÇÃO E DA INSTRUÇÃO PRELIMINAR
O projeto prevê um novo rito, específico para os processos de competência do júri, com uma instrução sumária-preliminar: Recebida a denúncia (ou queixa), o acusado é citado para resposta escrita em 10 dias (contados da efetiva citação válida). Em caso de inércia, é nomeado defensor (princípio da defesa efetiva). Ultrapassada a fase da defesa prévia, abre-se vista à acusação “sobre preliminares e documentos (5 dias). São inquiridas as testemunhas, seguindo-se diligências em 10 dias (no máximo).
2.1.1. AUDIÊNCIA DE INSTRUÇÃO
A instrução é orientada pelos princípios da oralidade e da concentração dos atos em audiência. São inquiridos, nessa ordem: ofendido (se possível) e testemunhas; esclarecimentos de peritos (se previamente requerido), acareação, reconhecimento de pessoas e coisas e, ao final, interrogatório.
Encerrada coleta de provas, seguem-se debates orais, destinando-se às partes o tempo de 20 min., prorrogáveis por mais 10min; havendo assistente admitido, terá a palavra (após autor) por 10min, prorrogando-se, neste caso, o tempo da defesa em 10min. Decisão, na fase da pronúncia, na própria audiência ou em 10 dias.
Nenhum ato será adiado, conduzindo-se coercitivamente os ausentes que deveriam comparecer. O prazo para conclusão da instrução é de 90 dias.
2.2. FASE DA PRONÚNCIA
2.2.1. PRONÚNCIA
A fundamentação da pronúncia é restrita (materialidade e indícios de autoria); a capitulação jurídica se refere ao tipo base, qualificadoras e majorantes. Surgindo notícia de co-autoria, em vez de aditamento para sua inclusão, procede-se à separação de processos.
O acusado solto com paradeiro ignorado será intimado por edital.
2.2.2. IMPRONÚNCIA
Nova denúncia em caso de prova nova, salvo extinção da punibilidade.
2.2.3. ABSOLVIÇÃO SUMÁRIA
Hipóteses evidentes de : a) inexistência do fato; b) não ser o réu autor ou partícipe do fato; c) o fato não constituir infração penal; d) causa de exclusão do crime ou de isenção de pena (salvo art. 26, caput, CP, se não for a única tese da defesa)
2.3. PREPARAÇÃO PARA JULGAMENTO EM PLENÁRIO
Início da segunda fase (judicium causae), com a supressão do libelo. Segue-se intimação para: arrolar testemunhas a serem ouvidas no plenário do júri, requerer diligências e juntar documentos;
Despacho preparatório do julgamento: deliberação sobre provas, saneamento de irregularidades, diligências para esclarecimento de fatos relevantes e relatório (escrito, que será depois entregue aos jurados) do processo.
2.4. ALISTAMENTO DE JURADOS
Podem ser jurados cidadãos maiores de 18 anos: 800 a 1.500 nas comarcas de mais de 1.000.000 de hab., 300 a 700 nas de mais de 100.000, e 80 (oitenta) a 400 nas de menor população (possível aumento; lista de suplentes). A lista geral será completada anualmente.
A maior novidade, que visa à “profissionalização” do jurado: exclusão, da lista geral, do jurado que tiver integrado o Conselho de Sentença nos 12 meses anteriores à publicação.
2.5. DESAFORAMENTO
Além das hipóteses atuais (ordem pública, dúvida sobre a imparcialidade do júri ou para segurança pessoal do acusado), o projeto prevê o desaforamento do julgamento em caso de excesso de serviço, se o julgamento não puder ser realizado no prazo de 6 meses, contado do trânsito em julgado da pronúncia – salvo o tempo de adiamentos, diligências ou incidentes de interesse da defesa. O assistente da acusação passa a ter legitimidade para o pedido de desaforamento, que tem preferência de julgamento da Turma ou Câmara do órgão ad quem, cujo relator poderá suspender o julgamento, se relevantes os motivos alegados.
Hipóteses de inadmissibilidade expressamente previstas: a) na pendência de RSE contra a pronúncia; b) após o julgamento, salvo se em virtude de fato concomitante ou posterior
2.5.1. DETERMINAÇÃO DE INCLUSÃO PARA JULGAMENTO PELO ÓRGÃO AD QUEM
Não havendo excesso de serviço ou processos aguardando julgamento em quantidade que ultrapasse a possibilidade de apreciação nas reuniões periódicas previstas para o exercício, “o acusado poderá requerer” ao Tribunal que determine a imediata realização do julgamento. Embora a exposição de motivos frise que somente o acusado poderia requerê-lo, não há como negar a faculdade ao Ministério Público (defensor da ordem jurídica e dos direitos fundamentais) – seja como parte, agindo no interesse da sociedade de evitar a impunidade e a prescrição (contraditório, paridade de armas), seja como fiscal da lei, na defesa do interesse indisponível do acusado de ver-se julgado em tempo razoável, haja vista o prejuízo social, moral e psicológico que o status de processado acarreta ao cidadão.
2.6. DO SORTEIO E DA CONVOCAÇÃO DOS JURADOS
O Juiz presidente reservará datas na mesma reunião periódica para a inclusão de processo que tiver o julgamento adiado. Sorteio dos jurados para a reunião pelo próprio Juiz, precedido de intimação do MP, OAB e Defensoria Pública, independentemente do comparecimento efetivo. Serão sorteados 25 jurados, em vez dos 21 atualmente previstos. Recusa no alistamento ou não comparecimento acarretam multa de 1 a 10 salários mínimos ao jurado. Havendo escusa de consciência, há previsão de serviço alternativo (proporcional e razoável): atividades administrativas, assistenciais, filantrópicas ou mesmo produtivas, no Poder Judiciário, na Defensoria Pública, no Ministério Público ou em entidade conveniada.
2.7. DA REUNIÃO E DAS SESSÕES DO TRIBUNAL DO JÚRI
2.7.1. ADIAMENTOS POR AUSÊNCIAS INJUSTIFICADAS
Ausência MP: redesignação primeiro dia desimpedido da mesma reunião; ciência ao PGJ do fato e da nova data. Se a ausência for do advogado: se outro não for constituído, adiamento único, ciência OAB, com designação de nova sessão no prazo mínimo de 10 dias, intimando-se a Defensoria Pública para patrocínio da defesa, que, no caso, independerá da condição econômica do réu (nada impedindo que o juiz arbitre honorários em favor da instituição, se for o caso, a serem custeados pelo próprio acusado).
2.7.2. AUSÊNCIA DO ACUSADO SOLTO
O julgamento não será mais adiado, se intimado.
2.7.3. AUSÊNCIA DO ACUSADO PRESO
Salvo pedido de dispensa de comparecimento subscrito pelo acusado e por seu defensor, adia-se para o primeiro dia livre da mesma reunião.
2.7.4. AUSÊNCIA DE TESTEMUNHA
Condução coercitiva, crime de desobediência, aplicação de multa. Somente haverá adiamento quando arroladas (art. 422) com a marca da imprescindibilidade e pedido de intimação por mandado. Certificada não-localização da testemunha, realiza-se o julgamento.
2.8. INSTRUÇÃO PLENÁRIA
Instalada a sessão, os jurados receberão cópias da pronúncia (e/ou decisões posteriores de admissibilidade) e do relatório do processo. Juiz, MP, assistente e advogado poderão inquirir diretamente o ofendido e testemunhas; jurados por intermédio do Juiz. Partes e jurados poderão requerer acareações, reconhecimentos, esclarecimento dos peritos, e a leitura de peças (exclusivamente precatórias, cautelares, antecipadas ou não-repetíveis).
2.8.1. INTERROGATÓRIO ENCERRA A INSTRUÇÃO
Após interrogatório judicial, MP, assistente, querelante e defensor perguntam diretamente ao acusado, se presente. Emprego excepcional de algemas, vedada referência nos debates (em seu benefício ou prejuízo)
2.8.2. DEBATES
Há expressa vedação de referência, sob pena de nulidade, à pronúncia como argumento de autoridade, silêncio ou, no dizer do projeto, “ausência de interrogatório por falta de requerimento”. Deve-se interpretar, aqui, ausência por falta de comparecimento (que passa a ser direito do acusado), pois a realização do interrogatório do acusado presente independe de requerimento, havendo imperfeição no projeto que, espera-se, seja suprida.
Inicia-se o debate com a sustentação da acusação admitida e de eventuais agravantes. Possibilidade de reinquirição de testemunha já ouvida em plenário, após a tréplica. Altera-se o tempo: uma hora e meia seguida de uma hora de réplica, se for o caso; se há mais de um acusado, acresce uma hora para cada e dobra o tempo da réplica. Possibilidade, via Juiz, de pedido de indicação da fonte do argumento pelas partes e jurados e de solicitação de esclarecimentos ao orador pelos jurados
2.9. SIMPLIFICAÇÃO DO QUESTIONÁRIO
De acordo com o projeto, serão formulados quesitos sobre: a) matéria de fato; e b) possível absolvição do acusado (que entendemos ser de formulação obrigatória, ex vi legis, independente das teses sustentadas pela defesa). Os quesitos serão elaborados com base na pronúncia, interrogatório e alegações das partes, observando-se a seguinte ordem: a) materialidade do fato; b) autoria ou participação; c) se o acusado deve ser absolvido; d) se existe causa de diminuição de pena alegada pela defesa; e) se existe circunstância qualificadora ou causa de aumento de pena (reconhecidas na pronúncia ou em decisões de admissibilidade posteriores)
2.10. VOTAÇÃO
A resposta coincidente em número superior a três encerra a votação (sigilo dos veredictos): interpretação sistemática dos arts. 483, §1° e 487 do projeto, a despeito de alteração da redação do art. 489 aprovada na CCJ da Câmara). Assim, não haverá revelação de decisão unânime. Negada materialidade ou autoria, absolve-se; afirmadas, quesita-se, ainda, se “o jurado absolve o acusado(?)”. Condenado, prossegue-se na votação.
2.10.1. VOTAÇÃO DA TENTATIVA E DA DESCLASSIFICAÇÃO
2.10.1.1. TENTATIVA
No caso de tentativa (ou alteração da tipificação para crime de competência do próprio júri), a quesitação se dará após o segundo quesito (ordem: materialidade-participação-tentativa).
2.10.1.2. DESCLASSIFICAÇÃO
No caso de alteração da tipificação para crime de competência singular: formulação de quesito após segundo ou terceiro, “conforme o caso”. A nosso sentir, numa primeira leitura do dispositivo, deve-se observar que, como regra, haverá a precedência da tese desclassificatória sobre a absolvição, salvo o caso de excesso culposo nas descriminantes, que justificariam a formulação do quesito após o terceiro.
2.11. RECURSOS
Secundun eventun litis, as decisões de impronúncia ou absolvição sumária desafiam o recurso de apelação; a decisão de pronúncia, recurso em sentido estrito.
O protesto por novo júri será simplesmente suprimido.
2 comentários:
Bom dia, senhores juristas.
Meu nome é Balbino dos Santos, sou advogado e milito há mais de quatorze anos no Tribunal do Jurí. Senti muito com a mudança nesta instituição, pois ela veio trazer maior facilidade ao trabalho mo MP e maiores dificuldades no trabalho do defensor. A tônica da mudança no rito do Tribuna do Júri, milindra com a satisfação de promotores sádicos que buscam os holofotes da imprensa e a progressão profissional, vez que parec que quanto mais conseguem a condenação mais fácil se torna para serem nomeados Procuradores de Justiça, até mesmo Procuradores Geral de Justiça. Nós advogados, nós que atendemos ao público maior que são os parentes dos acusados, sofremos pois não temos como explicar aos mesmos que seus filhos, maridos e netos serão condenados. Não há chance para a defesa, senão mentir, enrolar, pedir prorrogações até desaforamento de processos em busca de uma pseudo absolvição. A vítima sempre será uma vitima, mesmo depois de ter matado, estuprado, roubado, ela será sempre uma vitima e a sociedade? sem resposta, pois o homem é falivel, pode morrer como pode matar, e as instituições manipuladas pelo homem, matam mais. O Ministério Público vive o deleite de pedir a condenação com as mãos e pés amarrados, pois são infaliveis, não matam, não roubam, não desviam, não praticam peculato, não fazem nada, são santos, nós advogados praticamos tudo, somo o diabo, somos as ovelhas negras do direito. Mas a mudança na Lei em favor da vitima (ou do Ministério Publico) veio a calhar, pois somente assim o homem que defende o outro e menor do que o que defende a sociedade. O Brasil precisa de uma lei justa. A Constituição Federal de 1.988, dita por muitos comoa Constituição cidadã, nada fez para salvar o homem do outro. Fez sim para humilhar, mentir usurpar, e ainda é dito: NESTE PAIS NÃO TEM PENA DE MORTE. obrigado.
Balbino Laurindo Ribeiro dos Santos
Advogado 11.234 GO
Eu, uma HUMILDE estudante de DIREITO, fico perplexa e preocupada com o rumo do nosso país, que infelizmente, não assume que existe desigualdades sociais, raciais, educacionais, etc e NÃO faz NADA de REAL para MUDAR.
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