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27 de abril de 2007

Violência Doméstica e Prisão Preventiva


Com base na Lei Maria da Penha, a 4ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de Minas Gerais negou o pedido de Habeas Corpus a um acusado de violência contra mulher, preso preventivamente. Segundo o relator, desembargador Ediwal José de Morais “a violência doméstica contra a mulher vem sendo coibida com a recente edição da Lei 11.340/2006, conhecida como ‘Lei Maria da Penha’, na qual se prevê expressamente a possibilidade de decretação da custódia preventiva do agressor”.

De acordo com os autos, o acusado tem ameaçado a companheira e a família dela. Para os desembargadores, a prisão preventiva se justifica, pois é necessário preservar a vítima e impedir que o acusado volte a agredi-la.
A defesa alegou que o agressor é réu primário e possui residência fixa. Os desembargadores entenderam que esses requisitos não são suficientes, já que o acusado representa uma ameaça à tranqüilidade pública. Segundo eles, com base na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, apenas bons antecedentes não garantem a liberdade provisória.
Leia a decisão

HABEAS CORPUS 1.0000.07.451890-3/000

COMARCA DE CARLOS CHAGAS

PACIENTE(S): ELTONIR BATISTA DE SOUZA

AUTORIDADE COATORA: JD COMARCA CARLOS CHAGAS

RELATOR: EXMO. SR. DES. EDIWAL JOSÉ DE MORAIS

ACÓRDÃO

Vistos etc., acorda, em Turma, a 4ª CÂMARA CRIMINAL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos e das notas taquigráficas, EM DENEGAR A ORDEM.

DES. EDIWAL JOSÉ DE MORAIS - Relator

O SR. DES. EDIWAL JOSÉ DE MORAI (VOTO):
Referem-se os autos a habeas corpus impetrado em favor de Eltonir Batista de Souza, que se encontra preso preventivamente por ordem do MM. Juiz da Vara única da Comarca de Carlos Chagas, pela prática, em tese, de diversas infrações penais, inclusive aquela prevista no art. 129, § 9º, do CPB.
Insurge-se o paciente contra a situação de estar preso, alegando, em síntese, que não há motivos para subsistência da prisão, pois as suas condições pessoais - primariedade, possuir residência e domicílio certos - são aptas ao deferimento do seu pedido de liberdade provisória, que, se deferido, não afetará a ordem pública.

Com a inicial, vieram os documentos de f. 10-19.

A liminar foi indeferida às f. 24-25.

Informações da autoridade judiciária tida como coatora às f. 29, apresentando cópias dos autos às f. 30-116.

Manifestou-se a d. Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer emitido pelo Dr. Paulo Calmon Nogueira da Gama, pela denegação da ordem.

É o relatório, no essencial.

Conheço do pedido, pois presentes as condições de admissibilidade e processabilidade.
Infere-se dos autos que o pedido de revogação da custódia preventiva do paciente foi negado pela autoridade judiciária através da decisão de f. 115-116, alicerçada na necessidade de se garantir a ordem pública, em face da seqüência e gravidade das infrações, em tese, cometidas contra a vítima, presentes a prova da existência dos crimes e indícios suficientes de autoria, fundamentado, ainda, no parecer ministerial.

Baseia-se ainda o decisum no fato de que o paciente já deu causa a vários procedimentos delituosos em desfavor da vítima, já tendo sido beneficiado, em outras oportunidades, pela Lei 9.099/95.

A questão trazida foi bem examinada pela d. Procuradoria de Justiça, entendendo não haver constrangimento ilegal em se manter a custódia provisória do paciente.
De fato, pelo que se infere dos autos, notadamente através das cópias juntadas pela autoridade judicial, o paciente vem, constantemente, ameaçando a vítima e a seus familiares, inclusive sendo denunciado pela prática de vários delitos, dentre eles, dano, ameaça e violência contra a mulher.

Ocorre que, apesar de serem os delitos em que o réu está sendo processado apenados com detenção, os quais, em tese, somente permitiriam a decretação da preventiva nos casos do art. 313, II, do CPP, é imperioso ressaltar que a prática de violência doméstica contra a mulher vem sendo coibida com a recente edição da Lei nº 11.340/2006, conhecida como "Lei Maria da Penha", na qual se prevê expressamente a possibilidade de decretação da custódia preventiva do agressor, em qualquer fase do inquérito ou da instrução criminal, nos termos do art. 20 da mencionada Lei.

Não é só. Nos termos do parágrafo único do art. 20 da referida Lei 11.340/2006, o juiz poderá revogar a prisão, caso não subsistam os motivos que ensejaram o recolhimento do agressor ao cárcere, ou novamente decretá-la, se sobrevierem razões para tal.

Percebe-se, então, que a lei concedeu certa discricionariedade ao juiz para decidir sobre a necessidade da segregação cautelar do indivíduo que pratica violência contra a mulher, valendo-se de relações domésticas ou familiares.

Foi exatamente o que ocorreu nestes autos, pois, verificando o MM. Juiz a peculiaridade do caso diante das várias infrações, em tese, cometidas pelo paciente, a necessidade de seu acautelamento provisório, para prevenir a prática de novos delitos, considerando-se, ainda, que o réu já havia sido anteriormente beneficiado pela Lei 9.099/95 -, mediante parecer favorável do Ministério Público, corretamente decretou a custódia preventiva do acusado.

É certo também que eventuais circunstâncias de ser o réu primário e possuir residência fixa são insuficientes para a concessão da ordem impetrada, mesmo porque a reiteração delitiva, em curto espaço de tempo, indica a periculosidade do agente.
Outrossim, estando ameaçada a própria tranqüilidade pública, presentes os requisitos da prisão preventiva, isto é, prova da existência do crime e indícios suficientes de autoria, também justifica a manutenção da prisão cautelar, a fim de impedir que o paciente volte a praticar crimes.

Para a garantia da ordem pública, "a prisão cautelar é decretada com a finalidade de impedir que o agente, solto, continue a delinqüir", pois "há evidente perigo social decorrente da demora em se aguardar o provimento definitivo, porque até o trânsito em julgado da decisão condenatória o sujeito já terá cometido inúmeros delitos" (CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. 5ª ed. São Paulo: Saraiva, 2000, p. 229).

Nesse sentido:

"Estando suficientemente fundamentada a decisão que decretou a custódia cautelar do Paciente, como forma de garantia da ordem pública e da aplicação da Lei Penal (art. 312 do CPP), aferida com expressa menção à situação concreta, não se configura qualquer constrangimento ilegal. Habeas Corpus denegado". (STJ - HC 29241 - SP - 5ª T. - Relª Min. Laurita Vaz - DJU 17.11.2003 - p. 00347).

"O Superior Tribunal de Justiça pacificou entendimento no sentido de que a primariedade e os bons antecedentes do acusado, não são garantias, por si sós, para afastar a prisão preventiva, quando existentes nos autos outros elementos que recomendem, efetivamente, a referida prisão. Precedentes do STJ. 2. Recurso desprovido. (STJ - RHC 13820 - MG - 5ª T. - Relª Min. Laurita Vaz - DJU 23.06.2003 - p. 00391).

"A primariedade, os bons antecedentes, residência fixa e ocupação lícita constituem requisitos individuais que não bastam para a custódia provisória à vista da potencialidade e periculosidade do fato criminoso e da necessidade de assegurar-lhe a aplicação penal. - Recurso conhecido, mas desprovido". (STJ, RHC 7598, 5ª T., Relator Ministro José Arnaldo da Fonseca).

"Primariedade e bons antecedentes - Não havendo qualquer ilegalidade no flagrante e estando presentes os elementos autorizadores da prisão preventiva, não há coação ilegal na manutenção da custódia cautelar - Primariedade e bons antecedentes, por si sós, não justificam a concessão da liberdade provisória. Ordem denegada". (TJMG - HC 000.324.277-3/00 - 3ª C.Crim. - Relª Desª Jane Silva - J. 11.02.2003).

Por fim, a assertiva de que eventual condenação possibilitará a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos não socorre o paciente neste momento, por ser a prisão provisória de natureza processual, e não penal.

Ademais, a penalidade a ser futuramente aplicada, se condenado o paciente, não poderá ser antevista para concessão da ordem do habeas corpus.

Estando a decisão satisfatoriamente fundamentada, exarada pelo juiz que teve contato direto com os fatos, não subsistem razões para este Tribunal reformá-la.

Pelo exposto, denego a ordem de habeas corpus, mantendo a decisão combatida.

Sem custas.

Votaram de acordo com o(a) Relator(a) os Desembargador(es): WALTER PINTO DA ROCHA e ELI LUCAS DE MENDONÇA.
SÚMULA : DENEGARAM A ORDEM.
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MINAS GERAIS
HABEAS CORPUS 1.0000.07.451890-3/000

Revista Consultor Jurídico, 27 de abril de 2007

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