Entre
o Memento Mori e o Carpe Diem: A Reverência pela Vida no Júri
A vida é o tempo fugaz entre o primeiro respiro e o último expiro, onde cada segundo reflete a essência da existência humana. A cada instante, somos convidados a refletir sobre a transitoriedade da vida, lembrando-nos das palavras de Horácio: “tempus fugit, carpe diem et memento mori” – o tempo voa, aproveite o dia e lembre-se da morte. “Memento mori”, expressão latina que nos impele a reconhecer que, independentemente de nossas crenças, nossa existência tem prazo determinado, o que amplifica o valor do agora. Em contrapartida, o “carpe diem”, o convite a aproveitar o dia, nos direciona a viver com intensidade, a valorizar o presente e a buscar, em cada ato, uma manifestação de nossa existência com dignidade e plenitude.
Neste
contexto de reflexão sobre vida e morte, o Tribunal do Júri emerge como um
bastião de justiça na sociedade. Quando o Tribunal do Júri, composto por
cidadãos comuns, se reúne para julgar crimes capitais, ele assume
a tarefa sagrada de tutelar o direito fundamental à vida. É ali, no plenário do
Júri, que o Ministério Público age em defesa dos valores essenciais da
sociedade, representando não apenas o Estado, mas cada cidadão que clama por
justiça e proteção contra a violência. A missão do Promotor de Justiça é árdua: ele se
debruça sobre a dor dos que perderam entes queridos, estuda cada detalhe dos
casos e coloca-se diante dos jurados para lutar pela justa punição daqueles que
atentaram contra o bem mais precioso, a vida humana.
A
reverência pela vida torna-se, então, o norte de cada palavra e ação dentro do
Tribunal do Júri. Esse respeito profundo e inegociável pelo valor da existência
humana é o que sustenta a justiça e a importância de cada julgamento. A vida
não é vista apenas como um direito abstrato, mas como uma essência sagrada que,
quando violada, exige uma resposta firme e justa. Cada ato, cada veredicto, é
uma afirmação de que a vida humana é inviolável e que qualquer afronta a ela
representa uma ruptura no pacto social que não pode ser tolerada. Assim, o Tribunal
do Júri torna-se um espaço público de respeito e reverência, onde cada veredicto
busca restabelecer a ordem perdida com o crime, honrando aqueles que já não
podem falar por si mesmos.
A
atuação dos jurados, por sua vez, também é essencial para o funcionamento do
Tribunal do Júri. Eles representam a consciência coletiva, a voz do povo que
não tolera o desrespeito à vida. Cada veredicto proferido pelos jurados é uma
mensagem poderosa de que, apesar dos desafios, a sociedade ainda valoriza o
direito de cada um viver em paz e segurança. Ao assumir essa responsabilidade,
os jurados honram o “carpe diem” e o “memento mori” em sua forma mais profunda,
pois valorizam a vida ao mesmo tempo em que censuram com seriedade os atos que operam
à sua perda.
No
Brasil, os altos índices de assassinatos representam um enorme desafio ao Sistema
de Justiça e uma crise no valor que a sociedade atribui à vida. Em um país onde
milhares de vidas são ceifadas anualmente pela violência, o Tribunal do Júri
torna-se mais do que uma instituição judicial, ele se transforma em uma arena
de resistência, uma das últimas trincheiras em uma forma de reafirmar, perante
a barbárie, que o direito à vida merece tutela e que os crimes contra ela não
podem passar impunes. Cada julgamento, nesse contexto, é uma reafirmação da
norma e uma manifestação do poder simbólico da sanção, elementos cruciais para
a ordem social.
Ao Promotor de Justiça incumbe o dever de lembrar aos jurados que a luta pela punição de assassinos é também uma luta pela preservação dos valores fundamentais da sociedade. A
punição justa constitui ação afirmativa da fonte de todos os direitos humanos.
A impunidade alimenta a violência, enquanto a resposta enérgica e comprometida
dos que atuam no Tribunal do Júri busca resgatar a confiança no sistema e reafirmar
a inviolabilidade da vida. Quando o veredicto condena alguém que atentou contra
uma vida, ele reafirma que a morte não terá a última palavra.
Assim,
ao recordarmos o “memento mori”, não nos resignamos perante a morte, mas
fortalecemos nossa luta pela vida. Que o Tribunal do Júri continue sendo o
local onde a justiça se levanta em defesa dos que já não podem se defender, e
que cada membro do Ministério Público e do Conselho de Sentença mantenha viva a
missão de proteger, defender e tutelar, com coragem cívica e compromisso existencial, o bem mais
sagrado que possuímos: a vida.
Por César Danilo Ribeiro de Novais, Promotor de Justiça do Tribunal do Júri e autor do livro “A Defesa da Vida no Tribunal do Júri”.
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