A vida só tem um sentido, e o único sentido que a vida tem é quando investimos nossa vida na vida dos outros, ou quando encarnamos a luta dos outros como se ela fosse nossa, a luta do coletivo. Esta é a lida do Promotor de Justiça: lutar pela construção contínua da cidadania e da justiça social. O compromisso primordial do Ministério Público é a transformação, com justiça, da realidade social.



Pesquisar Acervo do Blog

21 de dezembro de 2011

Problema de arquitetura


A liminar do ministro Marco Aurélio Mello que esvaziou os poderes do CNJ para fiscalizar juízes representa um retrocesso, pois empurra para os tribunais, isto é, para pessoas perigosamente próximas aos investigados, a responsabilidade primária de processá-los.

E isso tende a ser um problema. Como mostra Daniel Kahneman em seu recém-lançado "Thinking, Fast and Slow", nossas mentes operam sob dois registros independentes e complementares. Há o Sistema 1, intuitivo, baseado em sentidos e emoções e que é muito rápido. Não temos de raciocinar antes de recusar comida estragada ou fugir de um predador.

Já o Sistema 2 é analítico e se vale de ferramentas como probabilidades e lógica formal. Ele é abstrato e lento.

Idealmente, um processo judicial seria decidido apenas pelo Sistema 2, que avaliaria o peso das evidências e calcularia o veredicto. Na prática, o Sistema 2 é preguiçoso, dispersivo e ainda se deixa levar por erros às vezes infantis gerados pelo Sistema 1.

Um exemplo chocante da inabilidade humana para julgar vem de um estudo com juízes do comitê que decide os pedidos de liberdade condicional em Israel. Os casos são distribuídos por sorteio e a junta os analisa por cerca de seis minutos. O índice de rejeição é alto: só 35% das condicionais são concedidas.

O problema é que as concessões se concentram no período imediatamente posterior às refeições, quando os juízes estão descansados e bem alimentados. Nesses momentos, 65% dos pedidos são aprovados, contra zero nas horas de maior fome.

Muito do que tomamos como decisões pensadas está contaminado por vieses e caprichos do Sistema 1.

A questão aqui não é confiar ou não nos desembargadores, mas, sim, criar estruturas que sejam o menos vulneráveis possível a influências espúrias, como compadrio, corporativismo e até os níveis de glicemia do julgador. O problema, no fundo, é a arquitetura do cérebro humano.

Por Hélio Schwartsman - Jornal "A Folha de S. Paulo" de 22/12/2011.

Um comentário:

Anderson - São José do Rio Claro/MT. disse...

O espírito de natal contagiou o ministro Marco Aurélio em sua decisão de aliviar para os corruptos de toga; o judiciário brasileiro é uma vergonha!

Postar um comentário

Atuação

Atuação

Você sabia?

Você sabia?

Paradigma

O Ministério Público que queremos e estamos edificando, pois, com férrea determinação e invulgar coragem, não é um Ministério Público acomodado à sombra das estruturas dominantes, acovardado, dócil e complacente com os poderosos, e intransigente e implacável somente com os fracos e débeis. Não é um Ministério Público burocrático, distante, insensível, fechado e recolhido em gabinetes refrigerados. Mas é um Ministério Público vibrante, desbravador, destemido, valente, valoroso, sensível aos movimentos, anseios e necessidades da nação brasileira. É um Ministério Público que caminha lado a lado com o cidadão pacato e honesto, misturando a nossa gente, auscultando os seus anseios, na busca incessante de Justiça Social. É um Ministério Público inflamado de uma ira santa, de uma rebeldia cívica, de uma cólera ética, contra todas as formas de opressão e de injustiça, contra a corrupção e a improbidade, contra os desmandos administrativos, contra a exclusão e a indigência. Um implacável protetor dos valores mais caros da sociedade brasileira. (GIACÓIA, Gilberto. Ministério Público Vocacionado. Revista Justitia, MPSP/APMP, n. 197, jul.-dez. 2007)