Sociólogo americano propõe castigos físicos como uma pena alternativa “barata e menos cruel”
(Peter Moskos, de 39 anos, americano, é professor de Direito e de Sociologia. Foi oficial de polícia de 1999 a 2001 e tornou-se Ph.D. em sociologia pela Universidade Harvard em 2004)
Época – Quais seriam as vantagens do chicoteamento?
Peter Moskos – É barato. É honesto. E, mais importante, não é a prisão. Prisões têm sido um erro e sempre serão. O problema é que nós não temos alternativas. E o problema específico dos Estados Unidos é ter 2,3 milhões de presos, mais do que qualquer país em qualquer momento da história. Temos sete vezes mais presos do que em 1970, mas os crimes não diminuíram na mesma proporção.
Época – Chicotear pessoas não vai contra os direitos humanos?
Moskos – Não, de modo algum. Uma das principais vantagens do chicoteamento é ser menos cruel que a prisão. Em meu livro, proponho aos criminosos a chance de escolher entre as duas opções. Oferecer uma alternativa ao que existe hoje não pode ser tão ruim. Se alguém achar o chicoteamento uma crueldade, basta não optar por ele. Mas aposto que muitas pessoas o escolheriam.
Época – Quem poderia ser chicoteado?
Moskos – Algumas pessoas são tão perigosas que devemos trancá-las com o simples propósito de mantê-las longe da sociedade. Essas ficariam presas. A maioria comete crimes isolados, não tem tendência a cometer outras vezes. Para esses, a punição física seria uma alternativa. Poderia servir na guerra contra as drogas. Proibir entorpecentes e jogar os viciados numa jaula não é uma boa solução.
Época – Uma chibatada equivaleria a quanto tempo de prisão?
Moskos – Seis meses. Na minha proposta, o condenado poderia trocar cada ano de prisão por duas chibatadas. O limite para a troca seria de uns 25 golpes, pois mais que isso poderia matar a pessoa.
Época – O senhor já foi chicoteado?
Moskos – Não! Também nunca fui condenado à prisão. Mas eu certamente escolheria o castigo físico.
Época – Sabe como é ser açoitado?
Moskos – É horrível! É uma punição brutal, assustadora e extremamente dolorosa. Mas é melhor que a prisão.
Época – Comparado à prisão, o castigo físico não seria muito brando?
Moskos – Alguns diriam que sim. Espero que todos concordem que não é suave demais. O sistema prisional foi inventado nos Estados Unidos, há 200 anos, para ser uma alternativa menos brutal que o castigo físico. Mas as carceragens pioraram de tal forma que o chicoteamento pode até ser considerado brando.
Época – Quem seria o chicoteador? Não haveria o risco de ele apanhar na rua de alguém que foi punido na semana anterior?
Moskos – O encarregado de dar as chibatadas poderia ser um guarda, juiz ou delegado, ninguém em especial. Não acho que a maioria das pessoas punidas guardaria mágoa do chicoteador. Ele estaria apenas fazendo seu trabalho.
Época – Quanto esse tipo de punição custaria, comparado a um período na cadeia?
Moskos – Sairia praticamente de graça. Nos Estados Unidos, um ano de cárcere custa em média US$ 30 mil por pessoa. E o que a sociedade ganha em troca desse investimento? Nada além de um ambiente de drogas e violência, uma escola da delinquência. O melhor que podemos fazer aos criminosos para evitar que piorem é mantê-los fora da cadeia, longe de outros criminosos.
Época– Penas de liberdade vigiada, como monitoramento eletrônico por pulseiras com GPS, não são uma alternativa melhor?
Moskos – Muito provavelmente. Mas é difícil a sociedade concordar com essas pulseiras com GPS, porque elas não parecem uma punição severa o bastante. Para uma alternativa ser politicamente aceitável, ela precisa incluir uma forma de castigo. Precisa doer de algum jeito. Açoite não é a solução perfeita, mas nenhuma é. Para mim, chicoteamento é bom o suficiente por ser uma solução melhor que a atual. Existem outras saídas, mas, enquanto elas não são adotadas, não deixemos o perfeito ser inimigo do bom.
Época – Quais países adotam o açoite? São lugares especialmente seguros?
Moskos – Cingapura e Malásia adotam o chicoteamento combinado com a prisão. Minha ideia é o castigo físico como substituto da cadeia, para reduzir a população carcerária. Esses dois países são considerados seguros, mas não creio que seja por causa do açoite.
Época – Qual é o problema de ir preso?
Moskos – O sistema prisional torna as pessoas mais propensas a cometer crimes. A penitenciária é baseada na falácia de que o cárcere pode, de alguma forma, curar o criminoso. Isso é besteira. Há uma necessidade clara de ajudar os criminosos a não cometer delitos, mas qualquer reabilitação precisa ser separada do encarceramento. O ambiente das cadeias é cheio de punições informais, como violência física, sexual e psicológica. Por isso eu digo que a prisão é desonesta. Precisamos enxergar de verdade que tipo de punição a sociedade aplica hoje.
Época – Chicoteamento não é mais vingança que reeducação?
Moskos – De qualquer forma, o encarceramento também não acaba sendo uma vingança? Alguém acha mesmo que a prisão é boa para o preso? Temos de nos perguntar que tipo de lição as pessoas recebem dentro da cadeia. Um chicote não ensina nada, mas as grades também não. Sou inteiramente a favor de ensinamentos, tanto que sou professor. Mas vejo a educação como forma de manter alguém longe do crime, não como correção.
Época – Quando o Estado pune um crime de um jeito que pessoas comuns poderiam fazer, não incentiva a justiça com as próprias mãos?
Moskos – Discordo. O papel do Estado é manter o cumprimento da lei, de forma que os cidadãos não se sintam incentivados a fazer justiça com as próprias mãos.
Época – O Estado não daria mau exemplo ao combater violência com mais violência?
Moskos – A prisão já é violenta. É fugir da realidade fingir que não é. Acho que o açoite é menos cruel e mais honesto sobre seu grau de punição. A pessoa paga exatamente o que o juiz determinou. No mundo ideal não haveria violência, e o Estado não teria por que ser violento, mas não vivemos nele. A lei precisa punir adequadamente os que se comportam mal. Quando a punição oficial não funciona, acabamos tendo algo pior. O Brasil tem um longo passado, e torço para que seja apenas passado, de policiais que condenam à morte, por execução, pessoas que não foram julgadas. É muita hipocrisia o Estado dizer que tem as mãos limpas por não cometer violência, enquanto seus agentes executam pessoas.
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