A vida só tem um sentido, e o único sentido que a vida tem é quando investimos nossa vida na vida dos outros, ou quando encarnamos a luta dos outros como se ela fosse nossa, a luta do coletivo. Esta é a lida do Promotor de Justiça: lutar pela construção contínua da cidadania e da justiça social. O compromisso primordial do Ministério Público é a transformação, com justiça, da realidade social.



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8 de setembro de 2008

A culpa é nossa


A Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) realizou pesquisa de opinião, em parceria com o Instituto Vox Populi. O resultado, além de apontar grande descrença dos brasileiros nos políticos, indicou que 80% dos eleitores entendem ser obrigação dos candidatos eleitos resolver problemas com órgãos públicos e pagar despesas como hospital, enterro etc. (Site de Notícias da AMB, http://www.amb.com.br, 12.08.2008). Há cerca de doze anos, o jornal Folha de São Paulo também veiculava resultado de pesquisa popular, onde a maioria dos paulistanos dizia preferir votar em quem “rouba, mas faz”.

Estamos em pleno século 21, mas corrupção é chaga antiga e generalizada no Brasil. No entanto, quatro séculos antes de Cristo, o filósofo grego Aristóteles já escrevia: entre o bem do indivíduo e o bem da cidade, é mais importante defender o bem da cidade.

O saudoso político e jurista Franco Montoro, no texto Retorno à Ética na Virada do Século (1997) revelava-se impressionado com o volume de publicações sobre ética nos anos 1990. Tratavam de ética na política, no direito, na indústria, no comércio, na administração, na justiça, nos negócios, no esporte, na ciência, na economia e na comunicação. Ao mesmo tempo, multiplicaram-se por toda parte movimentos populares ou associativos, reivindicando ética na vida pública, na vida social e no comportamento pessoal. Por que a ética voltou a ser debatida no mundo contemporâneo? “A resposta talvez possa ser indicada no célebre título do romance de Balzac, ‘Ilusões Perdidas’. Quiseram construir um mundo sem ética. E a ilusão se transformou em desespero. No campo do direito, da economia, da política, da ciência e da tecnologia, as grandes expectativas de um sucesso pretensamente neutro, alheio aos valores éticos e humanos, tiveram resultado desalentador e muitas vezes trágico”.

Todos nos indignamos com os muitos escândalos fartamente noticiados. Todavia, já pensamos que eles são a “cara” do Brasil? Sérgio Buarque de Holanda definiu o brasileiro como “homem cordial”. Possui sociabilidade aparente para obter vantagens pessoais e evitar cumprir a lei que o contrarie (Raízes do Brasil). É o famoso “jeitinho brasileiro”.

Muitos dos que xingam duramente os corruptos, são os mesmos que elegem políticos almejando benesses pessoais. Diversos homens públicos são identificados com o slogan “rouba mas faz”. Esses eleitores não idealizam os representantes que administrarão e elaborarão leis em nome da comunidade, mas os “amigões do peito” que vão resolver seus problemas: emprego, bolsa de estudo, tratamento médico gratuito, transferência do filho para a universidade pública e congêneres. Vão livrá-los de problemas com o delegado de polícia ou o fiscal de tributos, se possível ajeitando a remoção do “incômodo” funcionário para localidade bem distante. São os mesmos eleitores que sonegam imposto de renda, não fornecem recibo ou nota fiscal a clientes e consumidores, subornam o guarda de trânsito e o fiscal da fazenda, compram drogas de traficantes ou fazem apostas em jogos ilícitos. Se possível, fazem “amizade” até com o juiz de direito ou escolhem advogados que sejam “amigos” do magistrado, para conseguir “uma mãozinha” nos julgamentos de processos, ainda que contra a lei. Contudo todos se acham muito bons, boníssimos. Corruptos são os outros...

Nossos homens públicos precisam melhorar bastante sua conduta moral. Os cidadãos também. Quando os vejo perguntar por que o Brasil, seu estado ou cidade “não vão para a frente”, tenho vontade de dizer:

- Olhem-se no espelho. A resposta pode estar na imagem refletida do outro lado...

Por Rogério Medeiros Garcia de Lima, desembargador/TJMG, in jornal "Gazeta de São João Del-Rei" de 30/08/08.

Imagem: Guto Cassiano

Um comentário:

Anônimo disse...

Tem razão o articulista, porém nesse Brasil de hoje, vicejam os maus e o mau comportamento como é descrito, porque o meio legal, a chamada estutura judiciária assim o permite. Uma estrutura que se origina de outra estrutura corrompida, a legislativa, não pode com certeza funcionar de forma muito diferente. Os bons cidadãos são em maioria, mas estão reféns dessa situação. É certo que nossos homens públicos precisam melhorar bastante sua conduta. Mas sem dúvida alguma não melhoram sua conduta porque seqüestraram o sistema político da nação ao longo desses 20 anos e passaram a redigir leis parciais, facciosas, praticamente criminososas, contra as quais o cidadão comum fica sem ação. Pior ainda, os que deveriam zelar por um judiciário altivo e em massa protestar e até mesmo rejeitar leis viciadas e injustas, mostrando nisso toda sua eloquência em favor do cidadão e da nação, calam-se. Quem comete o maior pecado? O cidadão que nada pode fazer contra essa estrutura ou os que se beneficiam dela? É provável que o espelho das ruas mostre uma imagem distorcida, porém o espelho dos palácios legislativos e judiciários mostrará uma imagem bem mais feia.

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Paradigma

O Ministério Público que queremos e estamos edificando, pois, com férrea determinação e invulgar coragem, não é um Ministério Público acomodado à sombra das estruturas dominantes, acovardado, dócil e complacente com os poderosos, e intransigente e implacável somente com os fracos e débeis. Não é um Ministério Público burocrático, distante, insensível, fechado e recolhido em gabinetes refrigerados. Mas é um Ministério Público vibrante, desbravador, destemido, valente, valoroso, sensível aos movimentos, anseios e necessidades da nação brasileira. É um Ministério Público que caminha lado a lado com o cidadão pacato e honesto, misturando a nossa gente, auscultando os seus anseios, na busca incessante de Justiça Social. É um Ministério Público inflamado de uma ira santa, de uma rebeldia cívica, de uma cólera ética, contra todas as formas de opressão e de injustiça, contra a corrupção e a improbidade, contra os desmandos administrativos, contra a exclusão e a indigência. Um implacável protetor dos valores mais caros da sociedade brasileira. (GIACÓIA, Gilberto. Ministério Público Vocacionado. Revista Justitia, MPSP/APMP, n. 197, jul.-dez. 2007)