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22 de setembro de 2008

Crime: Bebida Alcoólica e Menor


Fornecimento de bebida alcoólica para crianças e adolescentes é crime, jamais contravenção penal

Por Fernando Martins Zaupa(*)

I - INTRODUÇÃO

Em tempos de discussão acerca das conseqüências do advento da chamada Lei Seca, aliada a divulgação pela imprensa dos efeitos da bebida alcoólica em menores de idade, tem-se, na contramão das finalidades do legislador pátrio e, por que não dizer, da sociedade brasileira como um todo, o crescimento dos defensores da corrente jurídica que tenta emplacar a tese de que o fornecimento de bebida alcoólica a crianças e adolescentes não seria crime; mas, sim, mera contravenção penal.

O que causa maior preocupação é ver que referida tese, de argumentos impróprios e de terríveis conseqüências práticas (pena irrisória, prescrição de ações em curso, sentimento de impunidade etc.), não apenas está sendo adotado por defensores de acusados e réus, como também vem cada vez mais sendo acatada por magistrados e tribunais.

Deste modo, eis o presente estudo, com fito de demonstrar a inconsistência de referida tese, demonstrando que a nefasta prática de fornecer bebida alcoólica a menores de idade constitui crime e, assim, deve ser severamente repreendido, como forma não apenas de se dar efetividade aos ditames protetivos da Constituição Federal aos infantes, como seres em desenvolvimento, como também estabelecer a reprovação e prevenção de sua ocorrência, nos moldes do Código Penal.

II - DA PROTEÇÃO INTEGRAL

A Constituição Federal, em seu art. 227, caput e §4º, estabelece:

"Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado, assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de coloca-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.

§ 1º a 3º - omissis;

§ 4º A lei punirá severamente o abuso, a violência e a exploração sexual da criança e do adolescente."

Observa-se que a Constituição Federal, que adentrou ao mundo jurídico nacional em 1988, claramente firmou que a sociedade brasileira deverá estar empenhada na proteção integral de crianças e adolescentes, e, para isso, postou que instrumentos seriam criados para punição dos transgressores.

Foi nessa esteira que surgiu em 1990, a Lei nº 8.069, conhecida pelo nome de Estatuto da Criança e do Adolescente.

Logo no início de sua codificação, eis um dos regramentos mestres:

"Art. 3º A criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei, assegurando-se-lhes, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade." (grifos não constantes no original)

Encontra-se clarividente na letra da lei serem as crianças e adolescentes titulares de direitos e, no caso, merecedores de atenção quanto a peculiaridade de serem pessoas em desenvolvimento, devendo receber dos pais, sociedade e poder público, respeito e dignidade, além de proteção integral (físico, mental, moral, espiritual e social), conforme reza do ECA:

"Art. 4º É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária."

Ocorrendo afetação aos seus direitos, há nitidamente necessidade de se coibir tais ofensas, seja quem for o responsável por tal violação.

III - DO FORNECIMENTO DE BEBIDA ALCOÓLICA A CRIANÇAS E ADOLESCENTES COMO CRIME

Foi pensando em dar efetividade às normas de proteção e repressão que o próprio Estatuto da Criança e do Adolescente, em seu art. 243, estampou como crime a conduta daquele que pratica uma das condutas mais nocivas a pessoas em desenvolvimento:

"Art. 243. Vender, fornecer ainda que gratuitamente, ministrar ou entregar, de qualquer forma, a criança ou adolescente, sem justa causa, produtos cujos componentes possam causar dependência física ou psíquica, ainda que por utilização indevida:

Pena – detenção de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa, se o fato não constitui crime mais grave."

A norma visa a responsabilizar aquele que fornece produtos cujos componentes possam causar dependência física ou química, sendo a bebida alcoólica, a toda evidência, um desses produtos.

Sobre a devida responsabilização, dispõe ROBERTO JOÃO ELIAS:

"É, portanto, desejável que se puna aquele que faz com que tais produtos cheguem às mãos da criança ou do adolescente, de qualquer forma que seja." [01]

No entanto, em esteira diferenciada, alguns juristas e profissionais da seara do Direito vêm sustentando a tese na qual aponta que a conduta de quem fornece bebida alcoólica a menor de idade estaria tipificado no art. 63, inciso I, da Lei de Contravenções Penais, alegando a incidência do denominado ‘princípio da especialidade’

Sobre referido princípio, destacam que o art. 243 do ECA trata de forma genérica ‘produtos cujos componentes possam causar dependência física ou psíquica’, enquanto o art. 63, inciso I, da LCP, trata especificamente de bebida alcoólica.

Somam ao princípio da especialidade, referidos defensores do afrouxamento repressivo, a utilização do que entendem ser uma ‘interpretação sistemática’ do Estatuto da Criança e do Adolescente, aduzindo que o próprio Estatuto, ao diferenciar ‘bebida alcoólica’ (art. 81, II) de ‘produtos cujos componentes possam causar dependência física ou psíquica ainda que por utilização indevida’ (art. 81, III), demonstraria que a bebida alcoólica não entraria no tipo do art. 243.

Com a devida vênia ao pensamento acima exposto, tem-se que se que o fato do legislador não ter inserido no artigo 243 do ECA, o texto contido no inciso II, do artigo 81 da Lei nº 8.069/90, que trata especificamente da bebida alcoólica, não afasta a sua aplicação, haja vista que citada regra refere-se a normas de prevenção, ao contrário do artigo 243 do Estatuto da Criança e do Adolescente, que vem previsto na seção referente aos crimes em espécie.

Isso porque a disposição de prevenção (Titulo III do ECA), contida no art. 81, é meramente exemplificativa, podendo ser ampliada, por exemplo, através de portarias e legislação específica (federal, estadual e municipal), variando o tipo de sanção.

VALTER KENJI ISHIDA, ao tratar da natureza do rol do art. 81, leciona:

"O rol elencado não é taxativo, podendo ser ampliado, mas tão-somente pela atuação do Juiz da Infância e da Juventude. Por exemplo, na Comarca de São Paulo, tem-se ação civil pública ministerial tramitando visando à proibição de venda a menores do ‘cerol’, produto utilizado para fazer o ‘cortante’ de pipas e papagaios." [02]

Deste modo, vê-se que o rol utilizado pelos defensores de mencionada tese, é de natureza exemplificativa, podendo o magistrado, através de uma portaria, fazer um regramento preventivo e, como sanção, haver aplicação de multa especificadamente estabelecida na própria portaria ou, ainda, multa por infringência ao art. 249, por exemplo (‘descumprir, dolosa ou culposamente, os demais deveres inerentes ao pátrio poder ou decorrentes de tutela ou guarda, bem assim determinação da autoridade judiciária ou Conselho Tutelar.").

Vê-se, pois, que a alegada ‘diferenciação’ feita pelo art. 81 do ECA é, na verdade, ‘apontamento exemplificativo’, não podendo ser interpretado, jamais, como ‘tratamento diferenciado’ e, assim, ser invocado para alegar não tipificação pelo art. 243.

Ainda, tem-se que somente lançando as finalidades da Constituição Federal e do Estatuto da Criança e do Adolescente ao limbo é que poderia ser alegado que suposta atipicidade derivaria, assim, de uma ‘interpretação sistemática’ do próprio Estatuto.

Seria enorme contra-senso e teratológica construção hermenêutica dizer que o Estatuto da Criança e do Adolescente, ao criar o tipo penal do art. 243, visou reprimir o fornecimento, por exemplo, de ‘cola de sapateiro’ a menor de idade [03], não tendo interesse em reprimir o fornecimento de bebida alcoólica, expressamente tido como vedado pelo Estatuto da Criança e do Adolescente no mencionado art. 81.

Já que se alega ‘interpretação sistemática’, volta-se a informar, não há como alegar que o Estatuto deixaria sem repressão o fornecimento de bebida alcoólica, ante a flagrante nocividade e afetação à saúde de crianças e adolescentes como seres em desenvolvimento.

O art. 6º do Estatuto da Criança e do Adolescente é expresso em apontar:

"Art. 6º Na interpretação desta lei levar-se-ão em conta os fins sociais a que ela se dirige, as exigências do bem comum, os direitos e deveres individuais e coletivos, e a condição peculiar da criança e do adolescente como pessoas em desenvolvimento"

Por sua vez, o art. 73, reza:

"Art. 73. A inobservância das normas de prevenção importará em responsabilidade de pessoa física ou jurídica, nos termos desta lei."

Verifica-se que a violação de norma de proteção, como o é o art. 81, II (vedação de bebida alcoólica a menores de idade), deverá ensejar responsabilização do infrator, nos termos ‘desta lei’, ou seja, do Estatuto da Criança e do Adolescente.

Assim, em interpretação ‘sistemática’, tem-se que o art. 243 do Estatuto da Criança e do Adolescente, claramente, visa a responsabilizar o infrator que está, ao fornecer produtos cujos componentes podem causar dependência, a violar o dever de prevenção, princípio basilar do ECA, perante as crianças e adolescentes como seres em desenvolvimento e fortemente suscetíveis aos nefastos efeitos da bebida alcoólica.

Como alegar, então, que a norma do art. 243, que não é norma penal em branco, não abarca a vedação de fornecimento de bebida alcoólica, porque haveria tratamento diferenciado?

Já foi dito que o rol é exemplificativo e, assim, ainda que houvesse ‘diferenciação’, essa ‘separação’ visa justamente a postar maior atenção à bebida alcoólica, pela maior gravidade que possui.

Segundo JOSIANE ROSE PETRY VERONESE (Doutora em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina e professora titular da disciplina Direito da Criança e do Adolescente dessa mesma Universidade), em pesquisa realizada pelo Centro Brasileiro de Informações Sobre Drogas e Psicotrópicos, órgão ligado à Escola Paulista de Medicina, entre estudantes da rede estadual de primeiro e segundo graus da cidade de São Paulo, revelou que 70,04% dos jovens começam a beber entre os 10 e os 12 anos de idade (nos Estados Unidos o índice é de 50,02%). [04]

Não são válidas, ainda, argumentações no sentido de aplicação do princípio da especialidade, já que a contravenção prevista no inciso I, art. 63, foi tacitamente revogada pelo art. 243, do ECA, um vez que o novo texto, embora de forma não expressa, regulou inteiramente a matéria precedente, englobando na sua figura típica a conduta de servir bebida alcoólica a menor de 18 anos, por tratar-se de produto cujo componente pode causar dependência física ou psíquica. [05]
Ainda, observe que o art. 63 da Lei de Contravenções Penais, adentrando-se na invocada questão da reserva legal, apresenta apenas o verbo típico "servir".

O art. 243 do ECA, por sua vez, apresenta como verboS típicos "vender", "fornecer", "ministrar" ou "entregar".

Ademais, o "fornecer", é acrescido de "ainda que gratuitamente", deixando claro que está a englobar o servir.

Assim, claramente o tipo do art. 243 do Estatuto da Criança e do Adolescente engloba o tipo penal do art. 63, I, da Lei de Contravenções Penais.

Aliás, se for aceita a funesta tese laxista, de que o art. 243 do ECA não se aplica quando o produto for ‘bebida alcoólica’, tem-se que pela também invocada tese da ‘reserva legal’, quem ‘vender’, ‘fornecer gratuitamente’ ou ‘entregar’ bebida alcoólica a menor de idade, não sendo caso de estar ‘servindo’, simplesmente não deverá ser responsabilizado, por se tratar de fato atípico. [06]

Pela visão dos defensores da tese mitigadora, estaria autorizado no país, a partir de agora, a venda de bebida alcoólica a menores de idade, desde que a mesma não lhe seja ‘servida’... Claro absurdo!

O Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul, não obstante a divergência existente, apresenta julgados no sentido da tipificação em tela:

"APELAÇÃO CRIMINAL – CRIME PREVISTO NO ARTIGO 243 DO ECA – VENDA DE BEBIDA ALCOÓLICA A MENOR – SENTENÇA CONDENATÓRIA – RECURSO DEFENSIVO – PEDIDO DE ABSOLVIÇÃO – ALEGADA FALTA DE PROVAS DA PRÁTICA DO DELITO E ATIPICIDADE DA CONDUTA POR AUSÊNCIA DE TIPIFICAÇÃO PENAL – DEPOIMENTOS TESTEMUNHAIS ALIADO A DECLARAÇÃO DA VÍTIMA E DE UM MENOR – PROVA SUFICIENTE – CONDUTA TÍPICA – CONDENAÇÃO MANTIDA – RECURSO IMPROVIDO. Os firmes depoimentos prestados pelas Conselheiras Tutelares, aliados à declaração prestada pela vítima e por um menor, que confirmaram ter o réu vendido bebida alcoólica a adolescente, são provas mais do que suficientes para sustentar a condenação pelo delito previsto no art. 243 da Lei n. 8.069/90, não havendo falar em atipicidade da conduta, porquanto expressamente prevista no Estatuto da Criança e do Adolescente. (TJMS, Rel. Des. José Augusto de Souza, j. em 4.10.2006, AC 2006.010118-0)

"APELAÇÃO CRIMINAL – INFRINGÊNCIA AO ARTIGO 243 DO ECA – VENDA DE BEBIDA ALCOÓLICA A MENOR – PRETENDIDA ABSOLVIÇÃO – NEGATIVA DE AUTORIA E ALEGAÇÃO DE FALTA DE TIPICIDADE – IMPOSSIBILIDADE – CONDUTA TÍPICA – AUTORIA COMPROVADA PELAS PROVAS TESTEMUNHAIS – INEXISTÊNCIA DE ERRO SOBRE ELEMENTO DO TIPO – NÃO-OCORRÊNCIA – IMPROVIMENTO. A conduta do agente que vende bebida alcoólica para menores de idade constitui crime elencado no art. 243 do Estatuto da Criança e do Adolescente. A simples negativa de autoria contrariada pelas demais provas produzidas nos autos não importa em absolvição do agente quando evidenciado que este, tendo conhecimento da idade dos menores, serviu-lhes bebida alcoólica, ciente de que isso é proibido, mantendo-se a condenação pelo crime acima citado. (TJMS, Rel. Des. Carlos Stephanini, j. em 20/09/06)

Diversos Tribunais pátrios também apontam a tipificação do art. 243 do ECA, para a conduta de quem fornece bebida alcoólica a menor de idade:

"TJSC – FORNECER SUBSTÂNCIA QUE PODE CAUSAR DEPENDÊNCIA FÍSICA OU PSÍQUICA (ÁLCOOL) A ADOLESCENTES – MATERIALIDADE E AUTORIA DEMONSTRADAS – PROVA ORAL SÓLIDA DANDO A CERTEZA NECESSÁRIA DE O AGENTE TER PRATICADO A CONDUTA TÍPICA PREVISTA NO ART. 243 DO ECA – ABSOLVIÇÃO INVIÁVEL" (parte da Ementa da AC nº 2004.032914-6, Rel. Juiz José Carlos Carstens Köhler)

"TJSC - Ementa: ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE - VENDA DE BEBIDA ALCOÓLICA A MENOR DE DEZOITO ANOS - ART. 243, ECA - PROVA INEQUÍVOCA - PRESCINDIBILIDADE DO LAUDO PERICIAL - RECURSO PROVIDO. Incide nas penas do art. 243 do Estatuto da Criança e do Adolescente, quem vende a menor de dezoito (18) anos, um copo contendo bebida alcoólica, que, in casu, distribuiu o conteúdo a outros adolescentes, ante a expressa determinação da lei, que a venda de álcool a menor de dezoito (18) anos (art. 81, inc. I, ECA), pois, "o álcool corroe o organismo, obnubila a razão, causa dependência física ou psíquica e destrói o núcleo familiar, formando o homem em parasita humano" (JOSÉ LUIZ MÔNACO DA SILVA). A caracterização do crime previsto no art. 243 do ECA, prescinde da realização do laudo pericial, haja visto que, além da ausência de previsão legal neste sentido, não se pode aplicar, na hipótese, a mesma exigência que se faz, para a configuração dos crimes definidos na Lei Antitóxicos. TJSC - Apelação nº 32.874 Florianópolis, 09 de outubro de 1.995."

A discussão está posta em termos acadêmicos e, de forma mais acalorada, nas peças jurídicas e sustentações nos tribunais.

O presente estudo visou a demonstrar, pois, a impropriedade da tese que visa a querem tirar da sociedade brasileira mais um instrumento jurídico na tentativa de prevenir e reprimir os transgressores das normas de defesa das crianças e adolescentes, como seres em desenvolvimento.

Espera-se ter alcançado o objetivo.

IV - CONCLUSÃO

Ante o exposto, chegam-se às seguintes conclusões:

1. A Constituição Federal e o Estatuto da Criança e do Adolescente estabelecem, no sistema jurídico pátrio, a incidência do princípio da proteção integral, visando a prevenir e coibir todo tipo de violação aos direitos de crianças e adolescentes, considerados como seres em desenvolvimento;

2. Em atenção a referido princípio, a conduta de vender, fornecer ainda que gratuitamente, ministrar ou entregar, de qualquer forma, a criança ou adolescente, produtos cujos componentes possam causar dependência física ou psíquica, aqui abrangida a bebida alcoólica, constitui crime, previsto no art. 243 do Estatuto da Criança e do Adolescente;

3. Não são válidas as tentativas de mitigar a devida repressão criminal, aduzindo constituir contravenção penal a conduta acima descrita (Lei de Contravenções Penais, art. 63, I), porquanto não cabível o chamado princípio da especialidade, tampouco apropriado o emprego da denominada interpretação sistemática;

4. O Estatuto da Criança e do Adolescente, através do art. 243, revogou tacitamente e integralmente o art. 63, I, da Lei de Contravenções Penais;

5. A sistemática do Estatuto da Criança e do Adolescente é de proteção integral, não se podendo, jamais, confundir a função das normas de prevenção (Titulo III do ECA), de caráter exemplificativo e genérico (inclusive para sanções administrativas e civis), com a sistemática penal, como ocorre nos crimes em espécie;

6. A alegada diferenciação de tratamento existente no art. 81, I e II, do Estatuto da Criança e do Adolescente, em face das bebidas alcoólicas e das substâncias que provoquem dependência, por estarem no corpo das normas exemplificativas e genéricas de proteção, visam a justamente demonstrar que o fornecimento de bebida alcoólica merecem maior atenção, não o contrário;

7. O art. 73, do Estatuto da Criança e do Adolescente, que rege em "disposições gerais’ as normas de proteção, entre as quais se encontra justamente o art. 81, II (bebidas alcoólicas), é expresso ao estampar que ‘a inobservância das normas de prevenção importará em responsabilidade de pessoa física ou jurídica, nos termos desta lei." Assim, sendo "desta lei", a responsabilização claramente está no art. 243, não podendo haver interpretação que remeta a responsabilização à Lei de Contravenções Penais.

Notas
[1] ELIAS, Roberto João. Comentários ao Estatuto da Criança e do Adolescente. São Paulo: Saraiva, 1994, pág. 214.
[2] Estatuto da criança e do adolescente – doutrina e jurisprudência. 6ªed. São Paulo: Atlas. 2005, p. 120.
[3] TJPR - APELAÇÃO CRIMINAL Nº 74185-5, DE CASCAVEL CURITIBA, 30 de Março de 1995 - (...) Realmente os peritos asseveram a fl. 88 "em face deste material encontrar-se seco, por evaporação dos solventes que primeiramente diluíam esta resina, fica impossibilitada a sua pesquisa." Entretanto, nem por isso deixou-se de atestar que produto perecido é semelhante a chamada "cola de sapateiro", bastando ler o contido a fl. 87 onde consta que "trata-se de uma substância amarela, de aspecto homogêneo, de odor fraco, semi-elástico, semelhante ao elastômero das colas conhecidas como de sapateiro". Disso tudo depreende-se que a apelante efetivamente cometeu o delito apontado no art. 243 do Estatuto da Criança e do Adolescente".
[4] SANTOS, José Heitor dos. Perigo constante – álcool é tóxico livre e gera criminalidade no país. Revista Consultor Jurídico, 22 de dezembro de 2002.
[5] O absurdo da tese em exame já se exterioriza à medida que se vê uma tentativa de convencer que o Estatuto da Criança e do Adolescente, de 13 de julho de 1.990, não seria aplicável ao caso (flagrantemente voltado à proteção de crianças e adolescentes como seres a serem protegidos), devendo prevalecer a Lei de Contravenções Penais, que é da distante data de 03 de outubro de 1.941.
[6] O extinto Tribunal de Alçada de São Paulo já decidiu, sobre a contravenção do art. 63, I, que ‘a conduta proibida consiste em ‘servir’ bebida alcoólica. O ‘vender’ não integra o tipo" (JTACrimSP, 40:128). Com base em referido entendimento, se a conduta de ‘vender’ não integra o tipo penal da contravenção e, pelo entendimento da defesa e do juízo, não se aplica o art. 243 do ECA a quem vende ‘bebida alcoólica’, tem-se, de forma claramente absurda e inadmissível, fato atípico!

(*) Fernando Martins Zaupa (foto) é Promotor de Justiça no Mato Grosso do Sul - in http://www.jus.com.br/ acessado em 22/09/08.

Um comentário:

Anônimo disse...

Ante o exposto, chegam-se às seguintes conclusões:

Que frente ao imenso castelo de leis, alíneas, incisos e tudo o mais mostrado acima, construído pedra por pedra e que conseguimos com árduo esforço ler, vemos que os bandidos "de maior" não só vendem cachaça aos bandidos "de menor" como também lhes vendem maconha, cocaína, crack, armas e vêem seus pupilos aprontarem os maiores crimes contra o cidadão comum. E se por acaso enconstarem a mão no criminoso mirim, ele, com uma simples pedrada jurídica, sem que entenda nada disso, derruba todo esse castelo de leis, porque não dizer de cartas, ao falar arrogante: "Sou de menor, quem manda sou eu". Essa frase, uma simples pedrinha jurídica, ao ser arremessada não deixa pedra sobre pedra do inútil castelo de leis.

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O Ministério Público que queremos e estamos edificando, pois, com férrea determinação e invulgar coragem, não é um Ministério Público acomodado à sombra das estruturas dominantes, acovardado, dócil e complacente com os poderosos, e intransigente e implacável somente com os fracos e débeis. Não é um Ministério Público burocrático, distante, insensível, fechado e recolhido em gabinetes refrigerados. Mas é um Ministério Público vibrante, desbravador, destemido, valente, valoroso, sensível aos movimentos, anseios e necessidades da nação brasileira. É um Ministério Público que caminha lado a lado com o cidadão pacato e honesto, misturando a nossa gente, auscultando os seus anseios, na busca incessante de Justiça Social. É um Ministério Público inflamado de uma ira santa, de uma rebeldia cívica, de uma cólera ética, contra todas as formas de opressão e de injustiça, contra a corrupção e a improbidade, contra os desmandos administrativos, contra a exclusão e a indigência. Um implacável protetor dos valores mais caros da sociedade brasileira. (GIACÓIA, Gilberto. Ministério Público Vocacionado. Revista Justitia, MPSP/APMP, n. 197, jul.-dez. 2007)