A vida só tem um sentido, e o único sentido que a vida tem é quando investimos nossa vida na vida dos outros, ou quando encarnamos a luta dos outros como se ela fosse nossa, a luta do coletivo. Esta é a lida do Promotor de Justiça: lutar pela construção contínua da cidadania e da justiça social. O compromisso primordial do Ministério Público é a transformação, com justiça, da realidade social.



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16 de janeiro de 2008

Medidas Radicais


A criminalidade que nos envolve revolta, e assusta as pessoas normais

"O governo não consegue segurar a criminalidade? Pouco importa, basta desarmar o cidadão comum, de bem, esse que não comete crimes, e diante da insegurança oficializada, pediria pelo menos a ilusão de uma chance de se defender, por pequena que fosse." (Roberto Campos)

A criminalidade que nos envolve revolta, e assusta as pessoas normais. O problema é que o medo e o desespero, duas emoções fortes, ofuscam a clareza da razão. E os amedrontados partem para a escravidão voluntariamente, como ovelhas adestradas seguindo rumo ao abatedouro. É um destino cruel e muitas vezes auto-infligido. Faltam debates sérios e sobram soluções mirabolantes, que aniquilam os direitos básicos do cidadão de bem. Sobram propostas absurdas que servem apenas para depositar ainda mais poder nas mãos dos burocratas "iluminados". Sobram medidas "emergenciais" que agravam ainda mais nossa crise, sem atacar suas causas. O país se enfiou em um enorme buraco? Então que se pare de cavar!

Marginais recebem este rótulo pois andam à margem das leis. Curioso é que todas as "soluções" apresentadas passam por mais leis, mais controle, menos liberdade individual. Atacam somente os efeitos, nunca as causas. Se o crime é cometido através de uma arma de fogo, então vamos simplesmente proibir a arma. Na Suíça, a maioria das pessoas tem arma, e a criminalidade é muito baixa. Mesmo nos Estados Unidos, os estados que permitem o porte de arma possuem as taxas mais baixas de criminalidade. Mas são apenas fatos, e estes não costumam entrar nos "debates" por aqui, que geram muito calor e pouca luz. Bandido comete assalto com arma, então veta a arma! Como se eles fossem respeitar a nova lei.

Seguindo a mesma linha de "raciocínio", algumas pessoas arriscam maior ousadia ainda. Uma modalidade de assalto bastante popular atualmente é o uso de dois bandidos em uma moto. Qual a proposta, que parece ter seduzido até o governador Sérgio Cabral? Proibir que o motoqueiro carregue alguém na garupa! Perfeito. Tentando reduzir o crime, que existe por outros fatores, como a inoperância do Estado justamente onde ele deveria focar sua ação, acaba-se com o direito da grande maioria das pessoas de poder curtir sua moto com um amigo ou namorada. Vamos extrapolar essa visão para ver onde isso pode acabar.

Se as estatísticas amanhã provarem que boa parte dos crimes ocorre de noite, por que não vetar os indivíduos de saírem neste horário? Se ficar claro que a maior parte dos assaltantes são homens, basta baixar uma lei proibindo estes de saírem de casa. Ocorrem muitos assaltos a carros importados? Veta-se a venda desses carros. Muitos assaltos em ônibus? Vamos acabar com esse meio de transporte perigoso. A Baixada Fluminense concentra grande parte da criminalidade? Risca ela do mapa, proibindo sua existência. Existem diversos policiais corruptos que facilitam o esquema da bandidagem nas favelas? Então basta acabar com a polícia. Bandidos costumam assaltar por dinheiro? Ora, no extremo, vamos decretar o fim desse maldito! A lista de atrocidades em nome do combate ao crime seria infinita.

Poucos são os que de fato focam nas causas, tentando sempre preservar a liberdade dos inocentes. Normalmente, os bem intencionados cidadãos aprovam medidas autoritárias até o ponto em que não afetam a sua vida particular. Mentalidade interessante. Dane-se a liberdade dos outros, quero a minha! Raro será ver o motoqueiro que passeia com a namorada aplaudir uma lei que proíba tal lazer. O problema é que os defensores de algo absurdo assim não pensam que o mesmo "argumento" para uma lei dessas vale para anular a sua liberdade específica. Afinal, se não podemos mais ter motos circulando com alguém na garupa, pois algumas motos com duas pessoas são usadas para crimes, como ter carros circulando? Bandidos usam carros também! E bicicletas...

O engraçado disso tudo é que as pessoas que aprovam tais medidas desesperadas costumam ser esclarecidas o suficiente para entender que o Estado grande é uma das maiores causas dos nossos problemas. Mas não atentam para o fato de que estão delegando cada vez mais poder justamente ao Estado, que amanhã pode, em nome do combate ao crime, interferir ainda mais na vida privada do povo. O medo é uma arma e tanto nas mãos dos políticos. Querem curar o câncer com nicotina.

O Brasil não precisa, definitivamente, de mais leis e regras tolas que ditam o passo do cidadão nos mínimos detalhes. Não tem nada que atacar as conseqüências, e sim as causas. A impunidade é que gera o aumento da criminalidade. De que adianta então colocar mais leis no papel? O marginal já é alguém que não segue as leis, e assim age devido à percepção de impunidade. E para se ter a sensação de punição, o governo tem que concentrar seus recursos nessa área, e não em todo o resto que se mete, drenando recursos escassos e empobrecendo o povo, que ainda se vê forçado a pegar o pouco que sobra e bancar sua segurança privada, com cercas, guaritas ou até carros blindados. É o risco de ser pego e a gravidade da punição que seguram o crime. Se chegamos a um grau intolerável de criminalidade, que se decrete estado de sítio, reconheça-se que estamos em guerra civil, e se coloque as Forças Armadas na rua. Mas alguém minimamente inteligente realmente acredita que irá se sentir mais seguro apenas porque decretaram que está proibido ter arma ou andar com duas pessoas numa moto? Francamente...

Lembro que o eficiente programa de Tolerância Zero adotado em Nova Iorque reduziu drasticamente os índices de criminalidade por lá. Ele consistia basicamente na teoria da "janela quebrada", a qual diz que pequenos delitos impunes são um convite para novos e maiores crimes. Portanto, a polícia agiu com dureza contra todos os crimes, desde o grafitismo vândalo. Mas não se pensou por lá em simplesmente proibir o uso do metrô quando este era alvo de vários assaltos e outros crimes. Atacaram as causas do problema.

Normalmente, quando tento confrontar com esses argumentos os adeptos dessas medidas como desarmamento ou proibição de garupa na moto, me acusam de "radical", rótulo perfeito para encerrar um debate. Na falta de argumentos sólidos, o ataque vazio é a melhor defesa. Eu pergunto então: sacrificar a enorme maioria das pessoas pacíficas e inocentes que querem curtir sua moto com gente na garupa, pelo risco de alguns serem criminosos, não é radical?

Por Rodrigo Constantino, Economista formado pela PUC-RJ, com MBA de Finanças no IBMEC, trabalha no mercado financeiro desde 1997, como analista de empresas e depois administrador de portfolio. Autor de dois livros: Prisioneiros da Liberdade, e Estrela Cadente: As Contradições e Trapalhadas do PT, pela editora Soler. Está lançando o terceiro livro sobre as idéias de Ayn Rand, pela Documenta Histórica Editora. Membro fundador do Instituto Millenium. Articulista nos sites Diego Casagrande e Ratio pro Libertas, assim como para os Institutos Millenium e Liberal. Escreve para a Revista Voto-RS também. Possui um blog para a divulgação de seus artigos


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