A vida só tem um sentido, e o único sentido que a vida tem é quando investimos nossa vida na vida dos outros, ou quando encarnamos a luta dos outros como se ela fosse nossa, a luta do coletivo. Esta é a lida do Promotor de Justiça: lutar pela construção contínua da cidadania e da justiça social. O compromisso primordial do Ministério Público é a transformação, com justiça, da realidade social.



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16 de agosto de 2007

Um tribunal para a corrupção


Reportagem publicada nesta Folha no último sábado, 11/8, sob o título "Deputado propõe ampliação de foro privilegiado para autoridades" distorceu o espírito e o conteúdo da proposta de emenda constitucional nº 115 que apresentei à Câmara dos Deputados para a criação do Tribunal Superior da Probidade Administrativa (TSPA).

Ao contrário do que sugere a reportagem, a proposta procura essencialmente acabar com a impunidade nos crimes contra o patrimônio público e nos atos de improbidade administrativa. A impunidade no Brasil desmoraliza todas as instituições republicanas e coloca em risco a própria democracia. As razões pelas quais sou favorável à extinção do foro privilegiado para autoridades públicas são de ordem filosófica e não se vinculam à questão da impunidade nos crimes e delitos por elas praticados.

A pura extinção do foro privilegiado não aumentará a punição dos culpados. Infelizmente, a impunidade não é privilégio de autoridades públicas. É a regra para quem paga bons advogados, pois as brechas no Código de Processo Penal a asseguram. Acaso não há assassinos confessos condenados que circulam livremente em nossa cidade?

Sendo realista e pragmático, não creio viver para ver aprovada uma reforma em nosso código que o simplifique e garanta uma seqüência célere entre apuração dos fatos, instrução dos processos, julgamento e cumprimento das penas da lei por parte dos culpados. A rapidez nessa seqüência, pelo menos em relação aos crimes e delitos praticados por autoridades, é essencial para evitar a desmoralização das instituições e o conseqüente risco autoritário.

Na segunda-feira, dia 13, esta mesma Folha publicou interessante entrevista com Stuart Gilman, especialista da ONU em combate à corrupção. Ele argumenta que a simples eliminação do foro privilegiado não aumentará a punição dos culpados. Afirma ele: "Não é a severidade da pena, mas a velocidade com que as pessoas são pegas e punidas que acaba com a noção de impunidade". Essa constatação o leva a propor a criação de uma "corte anticorrupção".

O TSPA não está concebido para lidar com determinadas pessoas, mas com todas as vinculadas a certos crimes. Nesse sentido, ele passa ao largo da questão da prerrogativa de foro. O tribunal será competente para julgar em primeira (e praticamente única) instância tanto crimes contra a administração pública quanto atos de improbidade administrativa, que hoje correm em esferas separadas do Judiciário, prejudicando a aplicação da Justiça para delitos similares praticados pela mesma pessoa. Essa competência se aplica a atos e crimes praticados por altas autoridades: ministros, parlamentares, governadores, desembargadores, prefeitos de capitais (e grandes cidades) e, também, os eventuais co-autores que não sejam detentores de cargos públicos. Ele terá regras processuais próprias para julgar com celeridade e de forma terminativa.

A proposta vem tendo ampla repercussão e provocando um debate salutar, tal como o verificado na última semana na sede do Ministério Público do Estado de São Paulo. As críticas e sugestões que recebi nessa ocasião se concentraram em dois pontos: a exclusividade da Procuradoria-Geral da República para atuar na promotoria no novo tribunal e a possibilidade de serem criadas câmaras especiais nos atuais tribunais regionais e superiores como uma alternativa ao novo órgão. Sobre o primeiro ponto, considero adequada uma ampliação dessa prerrogativa para todos os procuradores-gerais estaduais. Sobre o segundo, lembrei que os tribunais superiores atuais são apenas instâncias de recurso e já estão assoberbados de processos. Isso nos remete aos mesmos problemas hoje existentes com o processo penal já analisado.

Expressei no referido debate minha abertura para receber críticas e sugestões para o aperfeiçoamento da proposta. A única condição que imponho é que elas realmente contribuam para acabar com a impunidade em relação às autoridades públicas.

Quando tivermos algumas delas condenadas e cumprindo penas, estou seguro de que a corrupção -seja a de pequena monta, seja a que envolve grandes cifras- haverá de reduzir-se dramaticamente em nosso país. Nossa democracia e nossa república serão então mais fortes.

por PAULO RENATO SOUZA, 61, economista, é deputado federal (PSDB-SP). Foi ministro da Educação (governo FHC), reitor da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas) e secretário de Educação do Estado de São Paulo (governo Montoro). dep.paulorenatosouza@camara.gov.br - Folha de S. Paulo, 16/08/07.

Um comentário:

Anônimo disse...

Com todo respeito ao "bem intencionado" deputado, não há dúvida que o Tribunal de Improbidade é mais um artifício para fomentar a impunidade.

Ou seja, nada mais é que um foro privilegiado vitaminado.

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O Ministério Público que queremos e estamos edificando, pois, com férrea determinação e invulgar coragem, não é um Ministério Público acomodado à sombra das estruturas dominantes, acovardado, dócil e complacente com os poderosos, e intransigente e implacável somente com os fracos e débeis. Não é um Ministério Público burocrático, distante, insensível, fechado e recolhido em gabinetes refrigerados. Mas é um Ministério Público vibrante, desbravador, destemido, valente, valoroso, sensível aos movimentos, anseios e necessidades da nação brasileira. É um Ministério Público que caminha lado a lado com o cidadão pacato e honesto, misturando a nossa gente, auscultando os seus anseios, na busca incessante de Justiça Social. É um Ministério Público inflamado de uma ira santa, de uma rebeldia cívica, de uma cólera ética, contra todas as formas de opressão e de injustiça, contra a corrupção e a improbidade, contra os desmandos administrativos, contra a exclusão e a indigência. Um implacável protetor dos valores mais caros da sociedade brasileira. (GIACÓIA, Gilberto. Ministério Público Vocacionado. Revista Justitia, MPSP/APMP, n. 197, jul.-dez. 2007)