A vida só tem um sentido, e o único sentido que a vida tem é quando investimos nossa vida na vida dos outros, ou quando encarnamos a luta dos outros como se ela fosse nossa, a luta do coletivo. Esta é a lida do Promotor de Justiça: lutar pela construção contínua da cidadania e da justiça social. O compromisso primordial do Ministério Público é a transformação, com justiça, da realidade social.



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3 de julho de 2007

PORQUE ME ENVERGONHO DO BRASIL


por Peter Wilm Rosenfeld

Parte II

Em meu artigo anterior, mencionei que uma das razões pelas quais me envergonhava de meu País era a "absoluta e total imoralidade, indecência e quantos "iiis" mais fossem possíveis, de nossos três poderes, notadamente o Congresso".

Penso que devo elaborar um pouco mais sobre essa afirmativa.Para tanto, começo por aquele Poder que "deveria" servir de exemplo de retidão, sobriedade e correção, dando-nos a segurança de que nossos direitos sempre serão respeitados: o Judiciário.

Com toda a propriedade, quando a Constituição Federal se refere aos Poderes da República, cita em primeiro lugar o Poder Legislativo (que supostamente representa o povo), seguido do Poder Executivo (que deveria realizar aquilo que o povo desejasse ou determinasse via legislativo) e, finalmente, o Poder Judiciário, que deveria ser o árbitro de toda e qualquer disputa entre quaisquer partes em litígio, com suas instâncias máximas nos Tribunais Superiores.

Os chamados "operadores do direito" (advogados, procuradores, promotores, etc.) sempre se referem aos tribunais como a "excelsa corte", sublime. Aos juízes são reservados títulos, especialmente o de "excelência". Será que tais designações ainda são merecidas, se é que antes o foram?

Aprendi, ao longo de minha vida, e dito por juízes a quem respeito, que a eles, juízes, não cabe fazer as leis; isso é competência do Congresso, cabendo aos magistrados interpretar essas leis. A teoria pode estar certa; se estiver, penso que aos magistrados (juízes) deveria ser imposto que, sempre que verificassem que certas leis não eram corretas, ou justas, ou de acordo com a vida, propusessem sua correção/atualização. Ademais, aos juízes caberia observar uma lei bem maior, qual seja, a de que "justiça tardia não é justiça, é injustiça" . Finalmente, também aprendi que aos magistrados é obrigatória uma vida séria, honrosa e honesta, além de absolutamente imparcial. Não é nada disso que vemos no Brasil de hoje (que é o que conheço há 75 anos). Sei que há milhares de juízes (número que, infelizmente, deveria ser duplicado) por esse Brasil afora que foram e continuam sendo idealistas, trabalhadores, que têm sua profissão como um sacerdócio. A eles meu respeito e minhas homenagens. Mas também sei que estão aumentando em proporção assustadora aqueles que, "mutatis mutandis", estão seguindo o conselho de nossa Ministra do Turismo (a do "relaxem e gozem"): "se até os Ministros do STF fazem, por que devo ser diferente ?".

E o Poder Judiciário é cada vez menos respeitado. Exemplos? Não só dezenas e centenas, mas milhares. Qual a figura importante (em qualquer setor de atividade) presa por prevaricar, ou por ter confessadamente cometido assassinato? O Juiz Lalau está em prisão domiciliar, aproveitando seus milhões. Isso não vale!

Todos os outros estão soltos, com base nos famosos "habeas corpus"! Ademais, que esforço tem sido despendido pelo Poder Judiciário para que nossas leis sejam modernizadas, atualizadas, simplificadas? Que eu saiba, nenhum ! E qual a razão dessa omissão? A de que, quanto mais desatualizadas, confusas, complicadas, incompreensíveis, as leis, mais trabalho haverá para os "operadores do direito", e mais cada juiz poderá decidir de acordo com seu próprio entendimento,(ou interesse financeiro) por mais obtuso que seja. É isso que queremos? É disso que o País precisa? Tenho minha opinião. Cada um que formule a sua.

A seguir, o segundo poder: o Legislativo.

Como já mencionei em artigos anteriores, no sistema bi-cameral, o Senado (com igual número de representantes por cada estado da federação) representa os Estados, e a Câmara de Deputados, em que cada estado tem uma quantidade de representantes proporcionais à população, representa os eleitores. A quantidade de deputados por estado no Brasil não segue essa norma; com isso, poucos votos elegem um deputado em estado pouco populoso ao tempo em que são necessários muitos milhares de votos para eleger um deputado em estados como S. Paulo, Minas Gerais e outros.

O Senado deveria ser um órgão onde prevalecesse a sobriedade e a seriedade (que vem junto com a anterior), o que não acontece no Brasil (a propósito, recomendo a leitura do artigo do Sr. Paulo Brossard de Souza Pinto, publicado no jornal Zero Hora de Porto Alegre de 25 do corrente (www.clicrbs.com.br/jornais/zerohora/artigos), sobre o Senado, de que foi um dos ilustres membros).

Como se diz na linguagem popular, está virado em uma "zorra". O que mais falta são, exatamente, seriedade e sobriedade. Alguns de seus Presidentes já renunciaram a seus mandatos (ato de extrema covardia) para não serem cassados! Boa parte de seus atuais membros sequer foram eleitos! Outros tantos estão metidos em casos escabrosos! A esse organismo dava-se, antigamente, a designação de Câmara Alta, pois seus integrantes eram parte de uma elite política!

Quanto à Câmara dos Deputados, lembro uma expressão do então Deputado Márcio Moreira Alves, do RJ (do então MDB), referindo-se não ao parlamento mas sim, ao governo militar em 1969, como sendo um "valhacouto"(o que levou ao fechamento do Congresso e à edição do famoso AI-5). Pois bem, a Câmara dos Deputados atual, e a de algumas legislaturas até agora, tem sido um valhacouto, exatamente no significado que lhe dá o Dicionário Houaiss, em seu item 3. Todos se lembram da bailarina Ângela Guadagnin; também inesquecíveis Severino Cavalcanti, com sua barriga à mostra, os conhecidos por nomes exóticos, como Professor Luizinho, Bispo Gê Tenuta, Dr. Rosinha, Edigar Mão Branca, Ratinho Júnior, ou de um nome só, como Dagoberto, Deley, Izalci, Magela, Tático, Zonta.

Será que essa gente foi batizada assim? Em não tendo sido, será que se envergonham de seus nomes oficiais?

Ora, é ridículo e jamais deveria ser permitido.

Bem, é essa gente que é atraída pelos mensalões, que usa e abusa da prática das emendas ao orçamento para benefício (bolso) próprio, que carrega em suas próprias cuecas ou coloca nas cuecas de outros incontáveis notas de reais ou de dólares.

Que trabalha três dias por semana e ganha mais de R$ 100 mil mensais, 15 vezes ao ano, pagando imposto de renda sobre uma fração desse valor. É uma vergonha indescritível.

Excusado dizer que o problema da baixa qualidade intelectual (e, muitas vezes, moral) se repete nos legislativos estaduais e municipais. Nem poderia ser diferente. Para concluir essa segunda parte, devo lembrar que por um dos absurdos de nossa Constituição, parlamentares não podem ser julgados pela justiça comum; mas, só podem ser julgados pelo Supremo Tribunal Federal se o parlamento o permitir. Até hoje, é possível que as permissões possam ser contadas nos dedos de u’a mão; e o Supremo Tribunal Federal não condenou um único sequer.

Em artigos subseqüentes, tornarei ao assunto.

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O Ministério Público que queremos e estamos edificando, pois, com férrea determinação e invulgar coragem, não é um Ministério Público acomodado à sombra das estruturas dominantes, acovardado, dócil e complacente com os poderosos, e intransigente e implacável somente com os fracos e débeis. Não é um Ministério Público burocrático, distante, insensível, fechado e recolhido em gabinetes refrigerados. Mas é um Ministério Público vibrante, desbravador, destemido, valente, valoroso, sensível aos movimentos, anseios e necessidades da nação brasileira. É um Ministério Público que caminha lado a lado com o cidadão pacato e honesto, misturando a nossa gente, auscultando os seus anseios, na busca incessante de Justiça Social. É um Ministério Público inflamado de uma ira santa, de uma rebeldia cívica, de uma cólera ética, contra todas as formas de opressão e de injustiça, contra a corrupção e a improbidade, contra os desmandos administrativos, contra a exclusão e a indigência. Um implacável protetor dos valores mais caros da sociedade brasileira. (GIACÓIA, Gilberto. Ministério Público Vocacionado. Revista Justitia, MPSP/APMP, n. 197, jul.-dez. 2007)