A vida só tem um sentido, e o único sentido que a vida tem é quando investimos nossa vida na vida dos outros, ou quando encarnamos a luta dos outros como se ela fosse nossa, a luta do coletivo. Esta é a lida do Promotor de Justiça: lutar pela construção contínua da cidadania e da justiça social. O compromisso primordial do Ministério Público é a transformação, com justiça, da realidade social.



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3 de abril de 2007

LIÇÕES DO CRIME


O crime não dá tréguas e, no entanto, políticos, juízes e responsáveis de instituições penais de menores parecem compactuar com ele.
Nada é suficientemente horroroso para impulsionar uma modificação profunda do Estatuto da Criança e do Adolescente, para viabilizar uma redução da maioridade penal ou para fazer com que a impunidade não mais vigore em nosso país.
Os argumentos são os mais bizarros, desde o que uma medida como a redução da maioridade penal não modificaria a situação até a idéia de que todos podem ser reeducados. Suponho que os seus defensores queiram dizer que a situação, tal como existe, é, de fato, muito boa.
A falência da segurança pública no Brasil mostra algo substancialmente errado, que exigiria mudanças radicais, algumas das quais dizendo diretamente respeito à eliminação da impunidade que hoje impera.
Os que defendem o status quo são os que se acomodam a essa lógica da irracionalidade.
O soldado Ivonildo Gambert Biassi foi cruelmente assassinado, dentro de um ônibus na cidade de Porto Alegre, dormindo e portando um uniforme. O fato de portar um uniforme da Brigada Militar seria o seu “crime”, pelo qual teria sido “punido”.
Chegamos a uma situação tão absurda que um uniforme militar não tem mais nenhum efeito inibidor ou preventivo. O indivíduo policial é um alvo potencial de assassinos, que agem impunemente. Como pode um cidadão comum sentir-se seguro se nem os policiais causam respeito e/ou medo?
Um juiz da Vara da Infância e da Adolescência e uma diretora da Fase chegaram a dizer, com diferentes palavras, que a lei estava correta e os procedimentos teriam sido normais quando da liberação do menor envolvido no crime, na verdade, o seu autor direto. O menor já teria sido várias vezes detido e sempre liberado em circunstâncias ditas “sócio-educativas”. A diretora da Fase chegou a utilizar uma expressão que bem mostra a mentalidade vigente. Segundo reportou Zero Hora, em 06/03/2007, ela teria dito que ele teria “direito a ir para casa, recuperando o vínculo familiar”. Nada estranhamente é dito do vínculo familiar que foi rompido, o da família do policial assassinado, cuja filha de 2 anos nunca mais verá o pai que tanto amava.
À força de proteger delinqüentes, responsáveis pela observação da lei estão sistematicamente rompendo vínculos familiares e passando para a sociedade a mensagem de que o crime compensa.
Uma das declarações mais lúcidas das últimas semanas foi proferida pelo Secretário de Segurança Pública do Rio Grande do Sul, Ênio Bacci, quando perguntou-se, no momento do assassinato, por onde estariam os defensores dos direitos humanos, que são tomados de um mutismo constrangedor face a eventos deste tipo. Os ditos defensores dos direitos humanos acostumaram-se, de tal maneira, a defenderem os delinqüentes e criminosos, ou envolvidos em ações dos movimentos também ditos sociais, que “esquecem” que os defensores da ordem pública são também humanos.
Se tomássemos suas atitudes a sério, deveríamos extrair a seguinte conseqüência: policiais não são humanos! Por extensão, seus familiares e filhos não são igualmente humanos e não são dignos de manifestações e de respeito. Provavelmente, alguns desses ditos defensores irão ainda se manifestar na defesa dos assassinos!
Outro aspecto digno de menção reside em que o menor em questão teria sido detido 14 vezes. Isto significa que suas ações anteriores foram todas toleradas, contribuindo com a lógica da impunidade que terminou se traduzindo pelo assassinato de um pai de família, cuja profissão era ser policial. Se tivesse sido punido antes, se tivesse tido os seus movimentos restringidos, ele não teria contribuído para a existência de uma família destruída e uma criança órfã.
No entanto, como impera no país a tolerância a tudo, da corrupção de Brasília aos crimes cotidianos, há uma progressiva intensificação da violência, culminando em horrores como a morte deste policial ou o assassinato do menino João Hélio, arrastado a reboque em um carro feito um boneco.
Enquanto não introduzirmos no Brasil a política da tolerância zero, enquanto o politicamente correto continuar vigorando, o país continuará a mercê da violência.
O politicamente correto está baseado na falsa premissa de que o crime se explica por causas sociais ou, ainda, de que o homem é bom por natureza, sendo a sociedade a responsável por sua degeneração. Daí se deriva a concepção de que os presídios e centros de reabilitação deveriam ser essencialmente locais de regeneração.
Ora, há tipos de crime que mostram uma inclinação para a maldade, para a violência em estado puro, que exigem, tão simplesmente, que essas pessoas sejam retiradas do convívio humano livre. Há indivíduos que são irregeneráveis e sua “liberdade” é uma ameaça efetiva e virtual para todos os cidadãos. São indivíduos que merecem a pena máxima. Presídios são também lugares que preservam a sociedade daqueles que querem destruí-la.

por Denis Rosenfield, filósofo.

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O Ministério Público que queremos e estamos edificando, pois, com férrea determinação e invulgar coragem, não é um Ministério Público acomodado à sombra das estruturas dominantes, acovardado, dócil e complacente com os poderosos, e intransigente e implacável somente com os fracos e débeis. Não é um Ministério Público burocrático, distante, insensível, fechado e recolhido em gabinetes refrigerados. Mas é um Ministério Público vibrante, desbravador, destemido, valente, valoroso, sensível aos movimentos, anseios e necessidades da nação brasileira. É um Ministério Público que caminha lado a lado com o cidadão pacato e honesto, misturando a nossa gente, auscultando os seus anseios, na busca incessante de Justiça Social. É um Ministério Público inflamado de uma ira santa, de uma rebeldia cívica, de uma cólera ética, contra todas as formas de opressão e de injustiça, contra a corrupção e a improbidade, contra os desmandos administrativos, contra a exclusão e a indigência. Um implacável protetor dos valores mais caros da sociedade brasileira. (GIACÓIA, Gilberto. Ministério Público Vocacionado. Revista Justitia, MPSP/APMP, n. 197, jul.-dez. 2007)