A vida só tem um sentido, e o único sentido que a vida tem é quando investimos nossa vida na vida dos outros, ou quando encarnamos a luta dos outros como se ela fosse nossa, a luta do coletivo. Esta é a lida do Promotor de Justiça: lutar pela construção contínua da cidadania e da justiça social. O compromisso primordial do Ministério Público é a transformação, com justiça, da realidade social.



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15 de março de 2007

Endurecer a Lei Penal


Para um cidadão brasileiro que vive há meses na Europa, e acompanha, na medida do possível o que ocorre no Brasil, a sensação é de que a questão da criminalidade só piora. Comparado com o Brasil, os índices de criminalidade violenta aqui são, por assim dizer, “poéticos”. O Congresso Nacional, ao que parece, e finalmente, está se esforçando para aprovar leis que agravam a situação penal aos criminosos, como porte de celular pelo preso, aumento do prazo de progressão pela prática de crimes hediondos e aumento das penas que envolvem autoria de menores, além da diminuição da idade penal.Quero prestar o meu incondicional apoio a estas medidas que, se não forem as ideais, já são um bom começo. A verdade é que a sociedade brasileira não agüenta mais. Todos os dias os noticiários nos informam de crimes bárbaros. O brasileiro não pode mais sair de casa com a certeza do retorno. Dar um “tchau” em casa, pode ser um adeus...Isso é vida? Não, pois a falta de segurança afeta diretamente a qualidade de vida, e vivemos apavorados. Ao lado da verificação de tais índices, assistimos sempre aqueles discursos, muitos deles demagógicos, de que “alterações legislativas de endurecimento pouco ou nada alteram a política de prevenção do delito”, “A violência deve ser combatida pela causa”, “Cadeia não resolve”, “o criminoso precisa ser reeducado, e não punido”, “As leis penais não resolvem o problema da violência, mas amenizam a opinião publica” etc.Pois bem. Eu apenas concordo com o fato de que precisamos, urgentemente, de uma política séria de investimentos na qualidade de vida, na igualdade de direitos, na educação de base etc. Tudo isso é preciso, não tenho dúvida. Mas o problema é aqui e agora. Tudo isso é lindo e ideal, mas leva tempo. Não há qualquer chance de se aprovar e colocar em prática uma política deste nível para esta geração. Com sorte, muita sorte, nossos filhos, netos ou bisnetos, e se tudo correr bem, poderão desfrutar de uma sociedade assim, digamos, menos violenta. Mas e nós? E a nossa vida? Vamos continuar ouvindo esses discursos “idealistas”, “poéticos-demagógicos”, enquanto a violência toma conta de nós? Quando iremos —nós— progredir de regime de cumprimento de pena em nossa casa para um regime mais brando, onde ganhemos as ruas? Quando as ondas de criminalidade mais visíveis vêm, ouvimos esses discursos que não se pode “ter pressa”, o tempo passa, e tudo fica esquecido, até a nova onda de violência que choca. Se não fizermos nada, repito, agora, veremos as tais milícias agirem em nome da justiça à qual, de mãos atadas às leis (brandas), não podem exceder de seus limites. E as milícias levarão a sociedade à desordem, à ausência do Estado de Direito, à justiça pelas próprias mãos. É mesmo que dizer àquele que está se afogando que ele deve aprender a nadar. Morto não aprende nada. Salvem-no, primeiro, por favor, para depois tratar de ensiná-lo. Não me parece tão difícil entender que existe uma situação que é emergencial, de “estancar” o sangue. De revitalizar o coração do enfartado. De fazer respirar o acidentado. Depois vem o tratamento, a partir do diagnóstico sério, e com investimentos e acompanhamento. Ou seja: O que é urgente não pode esperar, requer solução rápida e imediata mesmo. Para ser curto e grosso, significa tirar o criminoso das ruas e colocá-lo atrás das grades, para que deixe de agredir a sociedade, para que esta sociedade tenha um pouco de paz, possa sair às ruas, trabalhar, estudar, divertir-se e voltar para casa. Para que esta sociedade possa se desenvolver.Vejamos uma simples comparação: São Paulo; Milão. No primeiro semestre de 2006, foram praticados em São Paulo, 62.937 homicídios; em Milão, 21. Em São Paulo, mais de 74.000 roubos; em Milão, 2.524 (dados: SSP/SP e jornal La Reppublica de 10 de março de 2007 —pág. 15). Mesmo assim, o povo italiano está revoltado com “tanta” criminalidade. Vejam que o número de homicídios em São Paulo é 30 mil vezes maior do que em Milão!!! Os 21 homicídios praticados em Milão em um semestre inteiro são menos do que os praticados em São Paulo em um fim de semana. Claro que a população de São Paulo é muito maior, mas não 30 mil vezes maior do que a de Milão, apenas três vezes maior. Mesmo assim, no sub-título da matéria do La Repubblica se lê: “O crime não se bate com demagogia”. Os reclamos populares são exatamente pelo, vejam só, “endurecimento” da legislação penal. Na matéria está escrito. “Maior policiamento não basta. Preto sobre o branco. Novas leis para punirem com maior rigor os criminosos”.Muito bem. Falamos sobre a criminalidade comum, das ruas, dos crimes violentos. Quanto à criminalidade organizada na Itália, aí então é que as leis foram duras e eficazes. Se as máfias não desapareceram, certo é que foram atenuadas, a níveis menos intoleráveis. E, enquanto isso, o Brasil, por alguns garantistas (do crime), e “dos direitos humanos” pouco dizem a favor das vítimas, porque, me parece, cometem um erro de origem. Confundem as coisas e tratam os criminosos como vítimas. E nem me digam que “eles não tiveram chances na vida”, porque eu citaria um número interminável de outros que também não tiveram “chances” na vida, e as encontraram, através do esforço indescritível do dia a dia, em atividades, quaisquer, honestas, e venceram.Enfim, política de investimentos sociais é imprescindível, sim, mas para as futuras gerações. Para agora, primeiro, vamos salvar o doente da morte, e depois pensar em tratá-lo.

Um comentário:

Anônimo disse...

Ótimo artigo do promotor Marcelo Mendroni. Já há algum tempo acompanho os artigos que publica. Profundo conhecedor de criminalidade organizada. Possivelmente uma das maiores autoridades brasileiras sobre o tema.

Gostei do blog. Só deixo duas sugestões para links: Reinaldo Azevedo e Olavo de Carvalho, que pra mim são os dois gigantes das letras e do jornalismo brasileiro (obs: o Olavo é editor do Midia sem Máscara).

Abraço,

Luiz Mendes.

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Paradigma

O Ministério Público que queremos e estamos edificando, pois, com férrea determinação e invulgar coragem, não é um Ministério Público acomodado à sombra das estruturas dominantes, acovardado, dócil e complacente com os poderosos, e intransigente e implacável somente com os fracos e débeis. Não é um Ministério Público burocrático, distante, insensível, fechado e recolhido em gabinetes refrigerados. Mas é um Ministério Público vibrante, desbravador, destemido, valente, valoroso, sensível aos movimentos, anseios e necessidades da nação brasileira. É um Ministério Público que caminha lado a lado com o cidadão pacato e honesto, misturando a nossa gente, auscultando os seus anseios, na busca incessante de Justiça Social. É um Ministério Público inflamado de uma ira santa, de uma rebeldia cívica, de uma cólera ética, contra todas as formas de opressão e de injustiça, contra a corrupção e a improbidade, contra os desmandos administrativos, contra a exclusão e a indigência. Um implacável protetor dos valores mais caros da sociedade brasileira. (GIACÓIA, Gilberto. Ministério Público Vocacionado. Revista Justitia, MPSP/APMP, n. 197, jul.-dez. 2007)