A vida só tem um sentido, e o único sentido que a vida tem é quando investimos nossa vida na vida dos outros, ou quando encarnamos a luta dos outros como se ela fosse nossa, a luta do coletivo. Esta é a lida do Promotor de Justiça: lutar pela construção contínua da cidadania e da justiça social. O compromisso primordial do Ministério Público é a transformação, com justiça, da realidade social.



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8 de dezembro de 2015

Incompatibilidade entre Roubo e Liberdade Provisória


Ementa: Habeas Corpus – Roubo e liberdade provisória – Incompatibilidade – Precedentes – Necessidade de resguardar a ordem pública - Insuficiência das medidas cautelares alternativas - Ordem denegada.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Habeas Corpus nº 0019515- 02.2015.8.26.0000, da Comarca de São Paulo, em que é paciente GUILHERME LEONARDO DA SILVA e Impetrante RENATO DA COSTA GARCIA. ACORDAM, em 9ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Denegaram a ordem. V.U.” de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão. (Voto nº 35.089) O julgamento teve a participação dos Exmo. Desembargadores SOUZA NERY (Presidente), OTÁVIO HENRIQUE e ROBERTO SOLIMENE. São Paulo, 6 de agosto de 2015. SOUZA NERY, Relator.

“A concessão da pretendida liberdade provisória é absolutamente incompatível com o crime imputado ao paciente. É que, em matéria de roubo – a mais intranquilizadora expressão da criminalidade nos dias presentes – devem ser observadas as seguintes regras:

A. não se relaxa prisão em flagrante formalmente perfeita;

B. não havendo prisão em flagrante, decreta-se a prisão preventiva;

C. se, por desatenção, o réu livrou-se solto, decreta-se sua prisão preventiva quando da prolação da sentença condenatória.

Instrumento de garantia do direito de ir e vir, reservado aos cidadãos ordeiros, que fazem bom uso de sua liberdade, o habeas corpus não pode ser degradado à função de “chave de cadeia” para quem assalta quando está indo, e torna a assaltar quando está vindo...[1]

A jurisprudência de nossos E. Tribunais tem reiteradamente decidido que roubo e liberdade provisória são conceitos antinômicos. Filio-me, de coração, a esse entendimento, aqui representado pelos julgados seguintes:

O agente envolvido em roubo à mão armada não tem direito à liberdade provisória, porque se trata de crime grave, violento, que intranquiliza a população e revela temibilidade do autor. São irrelevantes, portanto, os eventuais bons antecedentes e a menoridade do agente. É preciso resguardar a ordem pública e a segurança da população notoriamente abaladas pela onda de roubos e pelo clima de violência que impera no país.[2]

Tratando-se de roubo à mão armada e havendo concurso de agentes, seus participantes revelam alta periculosidade e não merecem a concessão do benefício da liberdade provisória, mesmo que sejam primários, sem antecedentes criminais e possuam residência fixa, pois a garantia da ordem pública deve ser resguardada e, se estivessem soltos, seria caso de decretação da prisão preventiva.[3]

Conceder liberdade provisória ao agente preso em flagrante por envolvimento em crime violento só contribuiria para manter em risco a ordem pública, para aumentar o sobressalto da população e para desprestigiar a Justiça.[4]

O juiz, na interpretação da legislação penal, há de encontrar-se atento à realidade dos fatos e ao momento presente, não podendo deixar de considerar a importância de suas decisões na contenção da onda de violência que se vem alastrando de maneira quase incontrolável, alarmando a população e intranquilizando as famílias. É de manter-se, assim, a decisão do TJSP que considerou justificável a prisão provisória de assaltante à mão armada preso em flagrante, por considerar patente sua periculosidade.[5]

É inadmissível a concessão de liberdade provisória ao agente de roubo qualificado pelo emprego de arma e pelo número de pessoas, pois trata-se de crime sabidamente gerador de grande intranquilidade social e revelador da periculosidade de seus autores, tudo a determinar maior rigor na aplicação da lei penal.[6]

A ousadia crescente das pessoas – como o paciente – envolvidas na criminalidade, sua absoluta desconsideração pela boa-fé alheia e a tranquilidade com que exercem sua funesta atividade de infringir as leis para obter vantagem ilícita, estão a exigir uma atuação – serena embora – rigorosa e enérgica do Poder Judiciário, que não se pode despir de suas responsabilidades no tocante a tal estado de coisas.

Assim, demonstrada a periculosidade e a perniciosidade social do agente, justifica-se, mais que isso, recomenda-se seja ele mantido fora do convívio das pessoas decentes. E para isso é certo que se mostram insuficientes as medidas cautelares previstas no artigo 319 do Código de Processo Penal, inaplicáveis ao caso do paciente. Estas as circunstâncias por que meu voto orienta-se no sentido da denegação da ordem, o que proponho à E. Turma Julgadora.



[1] TACrimSP, Hcs nº 296.072 e 295.782, dentre inúmeros outros.
[2] RJDTACrimSP, 4:182. No mesmo sentido, JTACrimSP, 88:87 e 87:426.
[3]  TACrimSP, 11ª Câmara de Férias, HC nº 325.342-9, rel. XAVIER DE AQUINO, j. 28-7-1998.
[4] RJDTACrimSP, 2:198.
[5]  STF, RHC nº 65.501-7, rel. Min. ALDIR PASSARINHO, in RT, 632:362.
[6]  RJDTACrimSP, 33:372. No mesmo sentido, RJDTACrimSP, 28:269, 25:427, 23:436, 22:468,
21:344 e 345, 19:187, 15:200, 12:173, 8:206 e 7:232.

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