A vida só tem um sentido, e o único sentido que a vida tem é quando investimos nossa vida na vida dos outros, ou quando encarnamos a luta dos outros como se ela fosse nossa, a luta do coletivo. Esta é a lida do Promotor de Justiça: lutar pela construção contínua da cidadania e da justiça social. O compromisso primordial do Ministério Público é a transformação, com justiça, da realidade social.



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7 de maio de 2011

A morte de Bin Laden


Foi correta a operação norte-americana para matar Osama bin Laden?

SIM
Havia base legal e moral para matá-lo

No dia 11 de setembro de 2001, a organização Al Qaeda perpetrou uma série de ataques em solo norte-americano. Desde então, os EUA estão em contínua guerra de legítima defesa contra essa organização.

A Al Qaeda continuou a atingir novos alvos americanos, afora as ações que foram desmanteladas pelas forças de segurança dos EUA.

Nada mais apropriado, à luz do Direito internacional, que os EUA possam atacar seu inimigo sem pedir licença a ele.

Afinal, Osama bin Laden estava abertamente planejando novos ataques contra alvos civis e militares.

Alijá-lo da disputa era uma questão de salvar vidas inocentes -e não apenas norte-americanas.

Nas Torres Gêmeas, em Nova York, faleceram pessoas de várias nacionalidades, bem como nos atentados em Madri, em 11 de março de 2004, e no metrô de Londres, em 7 de julho de 2005.

Localizado o esconderijo de Bin Laden, a escolha que o presidente dos EUA tinha a fazer era entre duas alternativas: não tomar qualquer atitude efetiva ou fazer algo que poderia ser questionável, por alguns, em termos morais e legais.

Creio que a decisão de Obama de usar a razão de Estado para atacar o esconderijo de Bin Laden foi mais satisfatória do que se nada tivesse feito. Como comprova a reação da população de seu país. A expressão razão de Estado significa o uso da força para a conservação do poder político e da segurança de determinada coletividade humana.

A corajosa decisão de Obama foi tomada em contexto de desconfiança sobre a lealdade do serviço de inteligência paquistanês (ISI).

Sabe-se que o ISI esteve envolvido em ações terroristas perpetradas, na Caxemira, pelo grupo jihadista paquistanês Lashkar e-Taiba, além de estar amparando a insurgência talibã no Afeganistão.

O fato é que a operação "Geronimo" resgatou a credibilidade tanto da força especial como do serviço de inteligência norte-americano, até então desacreditados em operações dessa magnitude.

O comando especial da Marinha (Seal) cumpriu a missão que lhe foi acreditada, usou grande poder de fogo, demonstrou acuidade e autoconfiança, além de não ter sofrido baixa humana.

A ação perpetrada contra Bin Laden reforça a nova doutrina de luta contra o terror iniciada por Israel.

O governo israelense alega que não se deve fazer uma diferenciação entre o escalão político e o operativo ("militar") de uma organização terrorista. Quem decide deve também ser punido.

Essa foi a lógica usada para eliminar os líderes islâmicos Ahmed Yassin e Abdel Aziz Rantisi, cofundadores da organização Hamas. Tal lógica não foi bem recebida, na época, pela comunidade internacional. Mas, agora, com a morte de Bin Laden, parece ter ocorrido uma mudança de opinião.

O secretário-geral das Nações Unidas, Ban Ki-moon, demonstrou apoio à operação norte-americana, e isso deve influenciar o Conselho de Segurança da ONU.

Winston Churchill lembrava que "a coragem é a primeira das qualidades humanas porque é a que garante todas as demais".

JORGE ZAVERUCHA, doutor em ciência política pela Universidade de Chicago (EUA), é professor da Universidade Federal de Pernambuco e pesquisador do Instituto Nacional de Tecnologia/ Instituto de Estudos Comparativos em Administração de Conflitos. Publicou recentemente o livro "Armadilha em Gaza - Fundamentalismo Islâmico e Guerra de Propaganda contra Israel".

* * *
NÃO

"V" de Vingança

Barack Obama, presidente dos Estados Unidos, conseguiu capturar Osama bin Laden no domingo passado. Quem executou a operação foram integrantes de uma tropa criada para realizar operações secretas. O Paquistão, país onde Bin Laden estava abrigado, não foi avisado das ações americanas.

"A justiça foi feita", afirmou Obama em seu pronunciamento após a ação. Para comemorar tal "justiça", milhares de pessoas saíram às ruas e aclamaram seu presidente como um herói; diversos líderes mundiais afirmaram que essa é uma "vitória contra o terror".

Mas trata-se mesmo de justiça?

Ou a ação dos EUA deve ser considerada como mera vingança? Justiça e legalidade não se confundem: não vou tratar aqui da legalidade da operação. A execução de Bin Laden não gerou protestos significativos na comunidade internacional.

O desrespeito à soberania do Paquistão, a aplicação de uma pena sem processo judicial, o segredo da operação, nada disso parece tão importante diante do objetivo final.

Os fins justificariam os meios, portanto? Processo judicial, sentença formal, Estado de Direito: esses conceitos seriam apenas tecnicalidades? A resposta é clássica e antiga: devemos desconfiar do poder e submetê-lo a fiscalização constante. A história ensina que os poderosos abusam de sua posição.

Um poder sem controle pode degenerar em autoritarismo: basta que a definição do justo se torne privilégio de um pequeno grupo de pessoas. Devemos desconfiar de Obama como desconfiávamos de Bush, ex-presidente dos EUA. Todo poderoso precisa ser vigiado, pois não estamos diante de uma luta do bem contra o mal.

Trata-se apenas de um Estado nacional que agiu com fundamento em seu Direito interno, sem a anuência clara da comunidade internacional, para levar adiante uma ação secreta e unilateral.

Não é razoável que o presidente dos EUA tenha o poder de decidir unilateralmente quem deve viver e quem deve morrer ao redor do mundo. E pouco importa que a execução de Bin Laden seja considerada "justa" pela opinião pública ou que venha a desestimular ações terroristas. A questão não é essa.

É preciso discutir quem deve ter o poder de tomar decisões assim e qual deve ser o procedimento a ser seguido. Diante do ocorrido, não seria surpresa descobrir que agentes americanos estejam no Brasil investigando a suposta ligação entre membros de organizações terroristas e a comunidade árabe local.

Haverá mais mortos em nome dessa justiça? É sabido que, na esfera internacional, o Estado de Direito ainda é uma utopia distante.

Nessa esfera, tem prevalecido o realismo do poder, que não se deixa limitar pelos aguilhões do Direito e fala em nome da justiça em toda e qualquer ocasião. Nesse registro, "justiça" passa a ser sinônimo de "opinião dos poderosos".

E não há novidade alguma em constatar que eles ajam dessa forma, disputando o poder em detrimento do Estado de Direito.

A novidade está em acreditar que o mundo deva ser assim. A novidade está em transformar essa triste realidade em uma regra que permita classificar a ação dos EUA como justa sem que haja protesto algum.

O autoritarismo nasce falando em nome da justiça, com o objetivo de fazer o bem. Mas sem permitir que a sociedade influencie seus atos, tomando decisões em fortalezas secretas, vigiadas por guardas armados. Para o bem da democracia, é fundamental que Obama ponha um ponto final na guerra ao terror e passe a combatê-lo em regime de normalidade, ao lado da comunidade internacional.

Nesse caso, será mais fácil aceitar que ele use a palavra "justiça".

JOSÉ RODRIGO RODRIGUEZ, mestre em direito pela USP, doutor em filosofia pela Unicamp, é professor, editor da revista "Direito GV", coordenador de publicações da Escola de Direito da FGV-SP e pesquisador do Núcleo Direito e Democracia do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento.

Fonte: Jornal "A Folha de S. Paulo" de 07/05/2011.

Um comentário:

Vellker disse...

A morte de Osama Bin Laden foi ao mesmo tempo uma vitória e uma derrota para os americanos. É na verdade uma vitória tática que vai lhes trazer mais perdas estratégicas do que ganhos na medida em que o tempo passar e os livros de História fizerem seu registro. Isso se no meio de tudo não aparecer algum sucessor de Osama para revidar, o que os radicais islâmicos também julgam seu direito.

Quanto à morte de Osama, nada a discutir. Os americanos estavam em seu pleno direito. Caçavam um terrorista responsável por vários atentados contra cidadãos americanos, se bem que o atentado às Torres Gêmeas em 2001, teorias conspiratórias à parte, é um acontecimento até hoje mal explicado.

Nisso os americanos cometeram seu primeiro erro. Segundo o relato oficial da Casa Branca, no desenrolar da ação fica claro que Osama poderia ter sido capturado com vida e em ação espetacular, ter sido levado para os Estados Unidos para um justo e incontestável julgamento. Fica a pergunta: que tipo de revelações Osama poderia ter feito? Ao que tudo indica revelações sobre serviços secretos, negócios de grandes empresas de petróleo no Oriente Médio e a ajuda americana contra os soviéticos no Afeganistão seriam tão explosivas que mesmo que quisesse se render, Osama teria sido morto.

Na captura de Adolph Eichmann em 1962 pelo serviço secreto israelense, o governo argentino não foi avisado. E porque deveriam se arriscar a avisá-lo? Era discretamente pró-nazista nos tempos da 2a. Guerra Mundial. Eichmann foi sequestrado, levado para Israel, julgado e enforcado. Nada do que ele dissesse deixaria os israelenses em situação difícil. Ninguém no mundo achou nada errado nisso. E de forma parecida, ao entrarem clandestinamente no Paquistão, a situação dos americanos era a mesma, sua atuação foi justificável.

Já no caso de levarem Osama vivo, as revelações que ele poderia fazer sobre seus "amigos" do Ocidente que de arábes nada tinham mas facilitaram seu trabalho seriam explosivas e o FBI logo se veria intimando banqueiros, industriais, empresários do ramo petrolífero, vendedores de armas e sabe-se lá quem mais para depoimentos. E muitos sairiam dos depoimentos para a prisão.

Além disso as seguidas mudanças de versão dos acontecimentos, a negativa de mostrarem a foto de Osama morto e as contradições dos altos membros da Casa Branca levam somente à conclusão de que o acontecimento além de obscuro, mostra-se carregado de fatos a serem ocultados do mundo. Com a divulgação de vídeos de Osama, supostamente trazidos com o material apreendido em seu esconderijo e divulgado pelos americanos sem nenhum áudio com a alegação de razões de segurança, vê-se claramente que o governo americano procura ocultar tudo o que for possível.

Direito os americanos tinham de caçar um terrorista que lhes inflingiu perdas pesadas, mas fica a inafastável impressão de que a morte de Osama longe de ser uma vitória, foi na verdade uma queima de arquivo.

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