A vida só tem um sentido, e o único sentido que a vida tem é quando investimos nossa vida na vida dos outros, ou quando encarnamos a luta dos outros como se ela fosse nossa, a luta do coletivo. Esta é a lida do Promotor de Justiça: lutar pela construção contínua da cidadania e da justiça social. O compromisso primordial do Ministério Público é a transformação, com justiça, da realidade social.



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22 de março de 2011

Homicídio e Legítima Defesa




Direito à vida é o mesmo que direito à existência. É fato incontestável que o direito mais valioso do ser humano é o de viver, de existir.

Sem vida não há que se falar em liberdade, honra, propriedade ou qualquer outro direito. Por isso, incumbe ao Estado a defesa jurídica desse superdireito.

Por essa razão é que esse direito primordial é tutelado por normas internacionais, Constituição Federal e legislação infraconstitucional. Daí a obrigação de defesa do todos-têm-direito-à-vida por parte das pessoas, da família, da sociedade e do Estado.

Logo, não se pode admitir a banalização dos assassinatos, como vem ocorrendo no Brasil. Afinal, são cerca de cinquenta mil homicídios por ano. Uma verdadeira carnificina e um claro exemplo de atavismo social.

São pessoas que, adonando-se da vida alheia, tolhem o direito à existência de seus semelhantes, inobservando o mínimo ético de que o outro é a encarnação do limite de sua ação.

Diante dessa situação crítica, é tempo de reverenciar a vida, de defendê-la de forma instransigente. A vida é muito valiosa para ser desprezada ou flexibilizada.

A regra, portanto, é - e deve sempre ser – a punição exemplar daquele que tirou a vida do outro. A exceção é a incidência de qualquer eximente, a exemplo da legítima defesa.

Para tanto, sendo exceção, essa causa de exclusão do crime só tem cabimento no caso de estarem rigorosamente presentes os seus requisitos. É vedada, por conseguinte, a interpretação elastecida dos mesmos, sob pena de desproteção ou proteção deficiente do direito à vida.

No caso da legítima defesa (art. 25 do Código Penal), uma das raras hipóteses de autotutela (est lex non scripta, sed nata lex), os requisitos (a) agressão injusta, atual ou iminente, (b) direito do agredido ou de terceiro, atacado ou ameaçado de dano pela agressão, (c) repulsa com os meios necessários, (d) uso moderado de tais meios e (e) conhecimento da agressão e da necessidade da defesa devem estar todos, precisamente, reunidos para que o agente seja por ela albergado.

Grosso modo, no homicídio, a legítima defesa é sinônimo de matar-para-não-morrer. É preferir enfrentar sete pessoas no Júri a seis pessoas nas alças do caixão. É uma reação, com o emprego do meio menos lesivo, cuja força empregada seja o bastante para cessar a agressão injusta, atual ou iminente, em busca da preservação da vida.

Numa linguagem metáforica, o fato deve se adequar (subsumir) perfeitamente ao artigo 25 do Código Penal, tal qual uma caixa de fosfóro, em que a gaveta (fato) se encaixe de forma ajustada a seu caixilho (norma penal).

Bem por isso, não se pode admitir o contrário, qual seja, que o caixilho se adeque ao fato, pois a regra é a punição daquele que violou o bem natural e jurídico vida.

Todavia, é um tanto quanto comum, no Tribunal do Júri, a defesa tentar inserir no caixilho pequeno (norma penal) uma grande gaveta (fato). É uma dupla violação, já que há ataque tanto à lei da física quanto à lei do direito. Vale dizer, lança-se mão de uma verdadeira tortura hermenêutica ao artigo 25 do Código Penal visando extorquir uma absurda confissão no sentido de ver seus requisitos indevidamente elastecidos, com a finalidade única de arrancar do Conselho de Sentença a absolvição injusta do assassino.

É a substimação da inteligência dos jurados. É a busca desenfreada da impunidade. É o menoscabo do direito à vida.

A sociedade, através dos jurados, precisa se precaver desse tipo de manobra defensiva, sob pena de tornar-se cúmplice da impunidade e da desvalorização do direito mais basilar da humanidade.

Torna-se, então, essencial que a palavra de ordem seja o respeito ao primado do direito à vida e que a regra seja a punição exemplar daquele que investiu contra esse superdireito, sem a concessão (injusta) da legítima defesa, quando seus requisitos não estiverem rigorosamente presentes. Corolários inevitáveis: ao assassino, a cadeia; e à família vitimada, a condolência e a justiça!

Por César Danilo Ribeiro de Novais, Promotor de Justiça (MT) e Editor do blogue www.promotordejustica.blogspot.com

3 comentários:

Anônimo disse...

Parabéns pela clareza e objetidade do texto. Realmente, vemos absolvições absurdas pelo Júri, em casos que nem de longe configuram legítima defesa. A análise de seus requisitos deve merecer uma interpetação restritiva. Matar deve ser a ultima ratio.

Paulo Borges Siqueira, funcionário público

Anônimo disse...

parabéns pelo blog. tenho uma pergunta.
Meu irmão é policial, quando foi atender uma ocorrência, a qual o marido ameaçava a esposa de morte, mas quando ele pm chegou ao local o marido havia evadido. em dado momento o marido voltou ao local armado e pilotando uma moto, momento em que o outro policial o agarrou, mas o marido, contrariando as ordens de parada arrastou o policial por 20 metros. diante disso, meu irmão correndo atras da moto e falando pra parar teve que efetuar um unico disparo nas constas do marido que veiro a óbito. o policial sofreu escoriações nos dois joelhos. gostaria de saber se isso é legitima defesa. obrigado.

Anônimo disse...

Caro Promotor de Justiça SR César Danilo Ribeiro apenas você se esqueceu de avaliar que no caso de legitima defesa poderia ser qual quer uma das parte a morrer porque então não precisaria existir legitima defesa É preferir enfrentar sete pessoas no Júri a seis pessoas nas alças do caixão apenas você se esqueceu da sua própria frase se fosse você que estivesse em uma situação como esta o que entendo pelo seu comentário e que você iria preferir estar dentro de um caixão e o que vocês promotores se esquece que quando uma pessoa morre em uma circustancia desta maneira foi porque ela mesmo provocou e que a pessoa que esta sendo jugada também tem família infelizmente so se faz uma pericia correta no Brasil quando são casos que vão parar na mídia ai sim se ve uma prova contundente dos fatos caso contrario vocês promotores fazem de um homicídio simples um homicídio qualificado por motivo fútil e colocando a pessoa que sobrevive em um presidio sem contar com os Direito meramente concedidos por lei o que se dizer de uma audiência de custodia para que ela serve apenas para dar esperança aos familiares dos que foi levado ate ela pois e muito raro a pessoa sair nesta audiência

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