A vida só tem um sentido, e o único sentido que a vida tem é quando investimos nossa vida na vida dos outros, ou quando encarnamos a luta dos outros como se ela fosse nossa, a luta do coletivo. Esta é a lida do Promotor de Justiça: lutar pela construção contínua da cidadania e da justiça social. O compromisso primordial do Ministério Público é a transformação, com justiça, da realidade social.



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10 de fevereiro de 2011

Como ficamos?


Estão lembrados do Affaire d’Outreau que em dezembro de 2000 mergulhou a França num vórtice?

Em resumo: sob a acusação de abuso de menores, foram presas 260 pessoas; dessas duzentas e sessenta, dezassete foram levadas a julgamento; quatro foram condenadas; um dos acusados suicidou-se na prisão. Em Novembro de 2005, Myriam Badaoui, principal testemunha de acusação, confessou ter mentido: «Les six appelants n’avaient strictement rien fait.» Quando a cabala foi desfeita, havia inocentes presos há três anos. Em defesa da honra perdida, os juizes reconheceram ter cedido à pressão social e mediática do caso. O Estado francês foi obrigado a indemnizar os acusados por erro grosseiro da justiça, [faute lourde] prejuízo material e prisão preventiva ilegal. O valor da indemnização foi mantido secreto. Fabrice Burgaud, o juiz de instrução, foi sancionado em Abril de 2009 com une réprimande avec inscription au dossier. Sobre o caso foram publicados dezenas de livros e realizados dois filmes para a televisão francesa.

A revista Focus publicou uma entrevista (antecipada ontem pela SIC) com Carlos Silvino, vulgo Bibi, principal testemunha de acusação do processo Casa Pia. Diz o antigo motorista da instituição: todas as pessoas que acusei estão inocentes; foi a polícia que me obrigou a fazer as acusações; foi a polícia que me obrigou a mentir em tribunal; tenho suspeitas de ter sido drogado pela polícia; tive pena dos rapazes, que se fartaram de levar porrada; os rapazes foram obrigados a assinar papéis sem os terem lido; conhecia Manuel Abrantes (o Provedor) e Ferreira Diniz (médico da Casa Pia); não conhecia nenhum dos outros arguidos; não conhecia a casa de Elvas, o apartamento da Avenida das Forças Armadas e a barraca da Buraca; nunca levei rapazes para nenhum desses sítios; «a investigação foi sempre orientada segundo objectivos previamente definidos [e] fui silenciado do princípio até ao fim.» Ricardo Sá Fernandes, advogado de Carlos Cruz, disse já que vai requerer ao Tribunal da Relação de Lisboa a junção da entrevista e nova audição de Carlos Silvino.

Como era público, Carlos Silvino dispensou os serviços do seu advogado no passado dia 17. Como se soube hoje, pediu desculpas pessoais a Manuel Abrantes, Ferreira Diniz e Hugo Marçal, não tendo conseguido falar com Carlos Cruz. Foi entretanto recebido em audiência por Marinho Pinto, Bastonário da Ordem dos Advogados.

O processo encontra-se na Relação de Lisboa, que avaliará os recursos. Para já, defesa e Ministério Público estão de acordo num ponto: o acórdão é nulo na parte relativa à casa de Elvas.

[Ao centro da imagem, o telegénico Fabrice Burgaud, juiz de instrução do caso d’Outreau, em fevereiro de 2009, no dia em que foi ouvido pelo Conselho Superior da Magistratura]

Um comentário:

Alex Leco disse...

Por que o espanto? Até parece que no Brasil algo ocorre de forma diferente. Lembra-se de um caso em Magalhães Bastos no Rio de Janeiro em que PMs (Diante de testemunhas) mataram um comerciante na Rua Pinto da Fosneca? Sabe no que deu? Em nada. Sabe por que? Nem o Promotores do Rio sabem do acontecimento. Só falta agora me pedir para formalizar uma denúncia. Ora o crime foi de grande repercussão, em tese, ação púbica incondicionada, mas ... cade?????

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O Ministério Público que queremos e estamos edificando, pois, com férrea determinação e invulgar coragem, não é um Ministério Público acomodado à sombra das estruturas dominantes, acovardado, dócil e complacente com os poderosos, e intransigente e implacável somente com os fracos e débeis. Não é um Ministério Público burocrático, distante, insensível, fechado e recolhido em gabinetes refrigerados. Mas é um Ministério Público vibrante, desbravador, destemido, valente, valoroso, sensível aos movimentos, anseios e necessidades da nação brasileira. É um Ministério Público que caminha lado a lado com o cidadão pacato e honesto, misturando a nossa gente, auscultando os seus anseios, na busca incessante de Justiça Social. É um Ministério Público inflamado de uma ira santa, de uma rebeldia cívica, de uma cólera ética, contra todas as formas de opressão e de injustiça, contra a corrupção e a improbidade, contra os desmandos administrativos, contra a exclusão e a indigência. Um implacável protetor dos valores mais caros da sociedade brasileira. (GIACÓIA, Gilberto. Ministério Público Vocacionado. Revista Justitia, MPSP/APMP, n. 197, jul.-dez. 2007)