Fui relembrando das vezes em que falamos sobre o Direito, a Justiça e coisas que versavam sobre política, a nação, tudo. Era visível sua indignação contra tudo o que era injusto. E a pequena estatueta da Justiça, de olhos vendados e com a espada e a balança nas mãos e de como você me explicou todo esse simbolismo.
Nessa nova fase da sua vida que começou após a formatura, sei que afora os planos de advogar na Defensoria Pública que você tinha, sempre inabalável em sua visão de defender os menos favorecidos e ao mesmo tempo emocionado ao comentar as decisões que mereceram sua aprovação ou não, as coisas sobre as quais sempre conversamos, chamadas de cidadania, sociedade, nação e sistema judiciário foram através da sua eloquência, protegidas com a mais correta e ampla defesa. E ao mesmo tempo seus planos de também se tornar promotor, após tudo o que pudesse aprender na vivência diária da defesa pública e também da advocacia, como usualmente é feita, e sempre verificando os editais de concursos. Fico pensando o que terá vindo primeiro. Seus planos sempre foram bons. Munir-se de todo conhecimento na defesa dos desfavorecidos, atuar na defesa dos que pudessem pagar seu trabalho e seu sustento e depois, com esse lastro de ideologia, técnica e paixão no trabalho, aí então candidatar-se ao cargo que lhe permitiria defender em essência o que chamamos de sociedade. Não sei se você pôde seguir toda essa trajetória, mas em todo caso saltava à vista o seu idealismo. E o seu costume de deitar-se depois de todos, repassando as aulas da noite mais uma vez.
Com todos esses planos já delineados em sua mente acreditei que alcançaria todo o sucesso. E penso que algum dia voltando a esta cidade poderei encontrá-lo para mais uma conversa sobre esses temas, da Justiça até a política dos nossos dias, que veremos então como estará. E você poderá me contar seus sucessos e seus reveses, suas alegrias e suas tristezas, enfim todo o seu aprendizado. Quanto aos seus princípios de justiça, correção e honestidade, sei que estarão não só fortes como sempre, mas inabaláveis. Experimentados na batalha diária pela justiça estarão com a têmpera da espada da Deusa Themis que você sempre tinha em sua mesa de estudos. Acredito que a terá ainda.
Me relembrando da sua alegria ao me contar os grandes julgamentos e as grandes defesas onde tribunos como Rui Barbosa, Sobral Pinto e outros atuaram no Brasil, fazendo a boa e louvável história dos grandes feitos do Direito e da Justiça, imagino agora que emoldurado na parede atrás de você estará o quadro com seu diploma, ao lado dos retratos de figuras veneráveis como essas. Pelo vidro limpo e claro poderemos ver esse diploma e relembrar a data de uma de suas maiores alegrias na vida.
Poderemos também traçar um paralelo com os caminhos seguidos por outros que se dedicaram ao estudo do Direito, mas não perseveraram em seu juramento de defender a Justiça ou pior ainda, talvez em seu íntimo nunca tivessem tido esse ideal. Tinham tão somente a idéia de obter o diploma e uma imensa capacidade de exercer uma prestidigitação jurídica, truques e barganhas, para não dizer na essência o banditismo puro e simples, disfarçado atrás de um diploma, assim como um assaltante disfarça o rosto com uma máscara.
Como você, pessoas assim também terão seu diploma na sala, mas sobre o vidro que deveria estar limpo haverá uma grossa camada de poeira, que mal deixará que enxerguemos o que um dia pensaram seus mestres que fosse a certificação de um ideal de vida. Acertos com criminosos, inocentes acusados, sentenças postas a leilão, quantos males se tornam possíveis a uma pessoa desvirtuada e com um diploma desses na mão? Perto da arma que ele se torna nas mãos de quem o tem assim, a arma empunhada por bandidos numa crime parece um simples pedaço de metal enferrujado. Seu escritório deixa de ser uma sala respeitável para se tornar um esconderijo. O que era autêntico passou a ser uma falsficação e a poeira nem deixará que quem o olha veja seu próprio reflexo. Melhor pensando, certas pessoas nem poderão olhar isso de frente.
Mas pelo sentimento e pelos ideais que você sempre demonstrou sei que estarei como cidadão agraciado por poder tê-lo como defensor público num momento de necessidade que a todos pode abater na vida. Ou bem orientado por um advogado correto e que me defenderá com o vigor de sua justa eloquência. Ou então, como promotor, mais uma vez contarei com sua defesa se for vítima de um crime. Ou se por um desatino desses que podem ocorrer na vida de qualquer um, eu estiver como réu, sei que pagarei o preço devido à sua acusação, que terá como sempre a Justiça como guia. De qualquer forma, justiça e correção farão a diferença.
E tenho certeza de quando quando olharmos o seu diploma emoldurado, relembrando a data festiva em que você chegou falando da sua formatura, sei que não haverá sobre o vidro que o cobre nenhuma poeira. Haverá sim o brilho que existe onde sempre está presente a Justiça e ao mesmo tempo, refletido sobre ele, a figura do seu rosto sereno e sabedor de que em momento algum seus ideais foram esquecidos. Melhor ainda, veremos o rosto de quem honrou seus mestres e defendeu o que entendemos por sociedade e cidadania. É o que permite a uma pessoa olhar o seu diploma e ao mesmo tempo olhar a si mesma com a certeza de que defende o que existe na alma de todos como o verdadeiro sentimento de justiça.
Um grande abraço e até a próxima.
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