A vida só tem um sentido, e o único sentido que a vida tem é quando investimos nossa vida na vida dos outros, ou quando encarnamos a luta dos outros como se ela fosse nossa, a luta do coletivo. Esta é a lida do Promotor de Justiça: lutar pela construção contínua da cidadania e da justiça social. O compromisso primordial do Ministério Público é a transformação, com justiça, da realidade social.



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19 de março de 2009

ECA e maioridade penal


A maioridade penal voltará a ser discutida no Congresso este ano, como informa a mídia. A PEC (Proposta de Emenda Constitucional) 20/99, que englobou os textos de outras cinco que tramitavam no Senado, foi aprovada pelas comissões apropriadas e se encontra agora pronta para ir à Plenário.

Alguns aspectos precisam ser analisados. Divulga-se que no atual sistema os menores não são submetidos a prisão. Isto não é verdade, porque os jovens entre 12 e 17 anos, quando praticam crime, denominado de ato infracional, podem ser submetidos a internação, prevista pelo ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente), cujo prazo pode ser de até três anos.

Muito embora seja classificada como medida sócio-educativa e tenha finalidade educacional, possuindo prazo relativamente curto, a internação vem claramente definida como medida privativa de liberdade, que significa prisão e hoje se sabe que as unidades de internação tornaram-se mini-presídios, um colégio para o crime.

A redução da maioridade penal serviria para combate efetivo à criminalidade? Não! A primeiro esclarecer tal questão se apresentam os exemplos de países onde a responsabilidade é inferior e o crime continua sendo praticado em proporcional larga escala.

As causas de criminalidade, principalmente juvenis, são extremamente complexas, envolvendo questões psicossociais e mesmo culturais que a singela tese de punição retributiva, baseada na denominada “lei de talião” ou de “o mal da pena contra o mal do crime” jamais conseguirão combater. O criminoso, maior ou menor, não se preocupa com sua punição, por achar que jamais será pego.

A redução da maioridade como medida de combate ao crime serviria apenas para segregar os indivíduos mais cedo em presídios, aumentando a população carcerária, inserida num sistema já reconhecidamente caótico, com maiores e mais sensíveis efeitos negativos para a sociedade.

Além disto, há pesquisas elaboradas por iniciativa do próprio Congresso que demonstram ser a Justiça brasileira mais rigorosa na punição de menores de 18 anos do que de adultos. Dados divulgados no ano passado demonstram que em termos proporcionais a população carcerária juvenil é muito superior à adulta, quando se confrontam os índices de crimes praticados no país. Além disto, em face da natureza dos delitos, enquanto para a criminalidade adulta há a possibilidade de graduação da pena, para os menores isto não ocorre, o que faz com que crimes de ofensividade diversa sejam punidos da mesma maneira.

Na verdade, o próprio ECA é muito mais violento do que a Lei Penal. Com efeito, esta orienta o juiz no momento da aplicação da pena, quando de sua fixação, para que ele analise a culpabilidade, a conduta, os antecedentes e outros fatores, inclusive de política criminal, para atender às finalidades complexas da reprovação e prevenção penal. Ainda oferece ao juiz a possibilidade de aplicação de um sistema progressivo de regimes, no qual o condenado deve iniciar a partir do mais grave caminhando para o menos. Tudo isto visando a recondução (obviamente num modelo ideal) do condenado à sociedade.

Já o ECA prevê uma série de “medidas socioeducativas”, porém a mais aplicada é a de internação, cujo conceito legal é exatamente de se constituir como “medida privativa de liberdade”, ou seja, prisão. O prazo máximo de três anos é, na maior parte dos casos cumprido integralmente, em que pese a exigência do exame semestral de avaliação para fundamentar sua continuidade.

Não há um sistema analógico de progressão, embora sejam previstas a semiliberdade e a liberdade assistida. Para ser aplicada a internação, mesmo sendo primário o adolescente, basta que o crime seja cometido mediante violência ou grave ameaça (critério formal). Não há qualquer base de apreciação relativa à culpabilidade ou ao que se pode chamar de elemento subjetivo da conduta, apesar de algumas menções esparsas sobre circunstâncias e gravidade da infração.

Para um combate efetivo à criminalidade, não há que simplesmente se mudar a lei. Falta a aplicação de uma teoria penal eficiente que, de modo complexo, possa embasar a produção de uma legislação competente, além de outro modelo hermenêutico que possibilite aos juízes a aplicação menos formalista e positivista da norma.

Criminalidade juvenil não se resolve com mudanças de faixa etária. Resolve-se com a verificação da periculosidade dos criminosos e com a certeza da punição. Para os menos perigosos, ressocialização; para os mais perigosos, cadeia.

Há necessidade de revisão de finalidades e atualização no modelo punitivo, considerando-se a idéia traduzida pela chamada “individualização da pena”. As medidas poderiam durar mais tempo, contendo porém um mecanismo de recuperação progressivo, ou seja, meios de permitir ao jovem um real retorno à comunidade.

A prisão é necessária, mas não para todos. O isolamento social gerado por ela provoca problemas e tem elevados custos. A sociedade em breve não mais poderá bancá-los. Há que se pensar em alternativas mais elaboradas do que a simples mudança de lei, a qual, sozinha, não impede o jovem de 15 ou 16 anos de matar uma pessoa.

Não se está tentando aqui estabelecer uma agenda de aplicação de supostos “direitos humanos” defendida por alguns grupos que gostam de aproveitar ocasiões de mídia. Trata-se de combater um problema cada vez mais grave que é a criminalidade infanto-juvenil e que não só a Justiça como o ECA não têm ambos nenhuma orientação mais concreta a respeito, salvo a utilização de eufemismos para reduzir o impacto doloroso de nossa injusta realidade.

Atuação

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Paradigma

O Ministério Público que queremos e estamos edificando, pois, com férrea determinação e invulgar coragem, não é um Ministério Público acomodado à sombra das estruturas dominantes, acovardado, dócil e complacente com os poderosos, e intransigente e implacável somente com os fracos e débeis. Não é um Ministério Público burocrático, distante, insensível, fechado e recolhido em gabinetes refrigerados. Mas é um Ministério Público vibrante, desbravador, destemido, valente, valoroso, sensível aos movimentos, anseios e necessidades da nação brasileira. É um Ministério Público que caminha lado a lado com o cidadão pacato e honesto, misturando a nossa gente, auscultando os seus anseios, na busca incessante de Justiça Social. É um Ministério Público inflamado de uma ira santa, de uma rebeldia cívica, de uma cólera ética, contra todas as formas de opressão e de injustiça, contra a corrupção e a improbidade, contra os desmandos administrativos, contra a exclusão e a indigência. Um implacável protetor dos valores mais caros da sociedade brasileira. (GIACÓIA, Gilberto. Ministério Público Vocacionado. Revista Justitia, MPSP/APMP, n. 197, jul.-dez. 2007)