A vida só tem um sentido, e o único sentido que a vida tem é quando investimos nossa vida na vida dos outros, ou quando encarnamos a luta dos outros como se ela fosse nossa, a luta do coletivo. Esta é a lida do Promotor de Justiça: lutar pela construção contínua da cidadania e da justiça social. O compromisso primordial do Ministério Público é a transformação, com justiça, da realidade social.



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23 de setembro de 2008

Desabafo - Procuradores da República


"Já é recorrente entre as Autoridades responsáveis pela investigação e a repressão ao crime de colarinho branco, no Brasil, dizer-se que nossa tarefa é uma luta contra o sistema. E nos referimos ao sistema formado pelas Leis e as Decisões feitas em Brasília.

(...)

Em resumo, quando de trata de perseguir criminosos de colarinho branco, estamos em todo o tempo lutando contra o sistema.

Basta contar quantas pessoas muito ricas estão presas, em caráter preventivo ou definitivo, em todo o país, pela prática de crimes financeiros, tributários ou de lavagem de ativos. Há dúvidas se a contagem passará dos dedos de uma mão. Ou é suficiente lembrar que o Supremo Tribunal Federal jamais condenou criminalmente ninguém, muito embora inúmeros inquéritos e processos criminais tenham lá tramitado.

Enquanto tais delinqüentes do alto escalão social gozam de sua fortuna, angariada com prejuízos milionários à sociedade, de outra parte inúmeros réus sequer condenados estão presos em Delegacias Públicas pela prática de crimes simples, como furtos (subtração sem violência ou ameaça) de pequenos valores. O rigor que lhes é aplicado, por alguma razão, não cabe àqueles primeiros.

(...)

Dentro desse contexto, o que deveria ser surpresa já não é: o tema da pauta da reunião entre as mais altas autoridades do Estado, Presidente do STF e Presidente da República, após um escândalo envolvendo a prática de crimes gravíssimos por figurões, não tinha por objetivo ampliar os mecanismos de investigação para reprimir e prevenir a prática desses crimes, mas sim reprimir abusos de autoridade nas apurações criminais, ampliando as garantias das pessoas investigadas. Claro que é importante que se assegurem as garantias fundamentais do indivíduo, agora outra coisa é ser esse o tema de reunião excepcional entre as maiores autoridades do Estado logo em seguida ao escândalo indicando a prática de crimes que mereciam forte censura.

Tudo isso mostra que a alta administração da Justiça Penal no Brasil não é, infelizmente, séria. O julgamento de ontem foi mais um capítulo desse livro.

Nós e o povo brasileiro estamos cansados de uma Justiça Criminal que, alegando as mais variadas filigranas jurídicas – que existem e podem ser encontradas e criadas às centenas -, não produz resultados práticos contra criminosos ricos e poderosos.

(...)

Tudo isso faz lembrar a frase de um experiente colega segundo o qual “tudo é feito para não dar certo, o nosso trabalho é só tornar isso mais difícil”.

Mesmo cansados e frustrados com o resultado, preferimos renovar as esperanças com a mesma fé em que Miquéias se apoiou em seu livro após descrever, no capítulo 7, um cenário jurídico e político hostil. E, até que tudo isso mude, e que consigamos efetivamente promover justiça em todos os níveis sociais, tentaremos, pelo menos, tornar mais difícil a injustiça.

Por fim, cumpre ressaltar que os subscritores são apenas dois dos vários Procuradores da República que se labutaram para dificultar que, nesse caso, tudo desse errado."

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3 comentários:

Anônimo disse...

São Paulo, terça-feira, 23 de setembro de 2008


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TENDÊNCIAS/DEBATES

Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo.
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A sociedade precisa ser alertada
ANTONIO CLAUDIO MARIZ DE OLIVEIRA


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Todos desejamos impedir a progressão da corrupção no país. Porém, combatê-la não é um fim que possa justificar a utilização de meios ilegais
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NÃO É preciso apontar os graves malefícios causados pela corrupção ao país. Despiciendo afirmar que todos nós desejamos impedir sua progressão e ver punidos os responsáveis. Tais objetivos não constituem privilégio de uns poucos, que se sentem detentores exclusivos das virtudes universais e enxergam os demais como criminosos -pelo menos, potenciais. No entanto, combatê-la não é um fim que possa justificar a utilização de meios ilegais. Há outros valores que devem ser preservados, ligados à dignidade humana e à própria democracia. Ultrapassar os limites da legalidade é tão grave para a cidadania quanto a impunidade.
Os excessos que temos visto na luta contra o crime não são percebidos pela sociedade, que não conhece as leis nem os princípios constitucionais e crê no que é divulgado pela mídia. Em razão da teatralização das operações policiais, a sociedade, à vista do homem preso e algemado, passa a considerá-lo culpado, embora ele não tenha ainda sido condenado, denunciado, processado nem sequer ouvido.
O cidadão comum, ademais, pensa ser absolutamente necessário o uso de algemas e o emprego do aparato bélico utilizado nas prisões dos suspeitos. Na realidade, esse aparato é simbólico, pois quer passar a idéia da eficiência policial e da pseudoculpabilidade do suspeito. No entanto, este é detido em sua residência, logo ao amanhecer, na presença de sua família, sem oferecer nenhum risco ao êxito das operações e à incolumidade física dos policiais.
O povo também imagina estar provada a culpa do suspeito em face da decretação da prisão temporária. Em todos as operações, não só os suspeitos são presos, mas todos aqueles -mesmo que indiretamente- ligados à empresa ou ao empresário investigado. Tais prisões atingem desde diretores até funcionários subalternos, passando pelos advogados, sem nenhuma verificação sobre a participação na conduta dita criminosa. Prende-se primeiro para indagar depois. O objetivo das prisões é obter a confissão ou a delação do que se fez ou se sabe, sob a promessa explícita da liberdade. É claro que, em face desse irresistível meio de persuasão -verdadeira tortura moral-, fala-se o que se sabe e o que não se sabe... Uma outra inverdade diz respeito à eficácia das escutas telefônicas como meio exclusivo de investigação. Elas constituem prova precária e insuficiente para justificar prisões e buscas, embora cômoda e confortável para ser produzida. É grande o grau de subjetivismo impregnado na produção dessa prova, pois as escutas são materializadas na forma de resumos, interpretações e comentários enviados para os autos.
A íntegra das interceptações não é remetida para o processo, sendo, pois, uma prova seletiva, de responsabilidade de policiais, que nem sequer são peritos e que, portanto, não assumem compromisso com a fidelidade das transcrições nem com a imparcialidade nas interpretações. O povo precisa saber que existe um sistema penal com direitos e garantias que, se forem desrespeitados em um caso, poderão sê-lo em qualquer outro, atingindo qualquer um.
Assim, de acordo com esse sistema, não se pode considerar alguém culpado antes de ser ele ouvido, antes de ser denunciado pelo Ministério Público, antes de ter exercido plenamente o seu direito de defesa, antes de terem sido produzidas provas, as da acusação e as suas, e antes de uma sentença condenatória definitiva.
Imprescindível que a sociedade saiba que toda prisão anterior ao cumprimento dessas fases, que constituem o chamado devido processo legal, só pode ser decretada com base em fatos que justifiquem sua necessidade, pois possuem caráter excepcional, em respeito ao sagrado direito à liberdade e exatamente para que não se julgue culpado alguém que ainda não foi julgado nem se defendeu.
Essas violações aos direitos individuais precisam ser denunciadas, para que não sejam louvadas por uma sociedade que as ignora e que desconhece os riscos que elas representam.
Esse é o outro lado de uma questão que vem sendo posta de forma parcial e maniqueísta. Os limites entre a questão criminal e os direitos individuais devem ser respeitados. As vozes que se erguem em seu prol precisam ser ouvidas. O que dizem precisa ser sopesado e analisado pelos responsáveis pelo combate ao crime, que também têm compromisso com a dignidade humana e com o Estado democrático de Direito.

ANTONIO CLAUDIO MARIZ DE OLIVEIRA, 63, é advogado criminalista. Foi presidente da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) e da Aasp (Associação dos Advogados de São Paulo), além de secretário da Justiça e da Segurança Pública do Estado de São Paulo (governo Quércia).

Anônimo disse...

Acho que o MPF está tentando jogar a culpa de seus próprios erros nas instâncias superiores do Judiciário.

O MPF deve cuidar de oferecer denúncia que não seja inepta, e também com base em indícios sérios de prova.

Anônimo disse...

O texto que merece parabéns. O desabafo dos procuradores da República é lúcido e claro e ataca o cerne desse poder corrupto que seqüestrou a Justiça em nossa nação. Finalmente estamos alcançando no Brasil o estágio em que o cidadão não quer mais saber de truquinhos legais, feitos por mágicos jurídicos pagos a peso de ouro.

Aliás toda essa conversa de legalidade em perigo, democracia em perigo serve unicamente para um fim: tentar manter o quanto for possível esse estado de vício e corrupção legalizados, com o disfarce de lacrimosamente defender o cidadão, fingindo-se de sentinela da Democracia, quando só lhe interessa vigiar o ouro que ganha nisso tudo.

O mesmo advogado que defende o cidadão até as lágrimas numa tribuna, conseguindo o Habeas Corpus de mais um corrupto, é o mesmo que passa em frente do hospital público, onde esse mesmo cidadão agoniza por falta de socorro e não se comove nem um pouco, está ocupado conferindo se o pagamento de sua milionária defesa já foi feito. Sim, apesar do discurso pretensamente humanista e legalista, os fins justificam os meios.

E os fins são ganhar muito dinheiro e prestígio defendendo os mesmos corruptos, que ele sabe serem corruptos em crime de primeiro grau. E o resultado do crime ele vê na sua frente, os cidadãos morrendo à míngua na porta dos hospitais públicos, que foram roubados exatamente por mais esse corrupto que ele acabou de defender.

Sim, hipocritamente, os fins justificam os meios. E se o meio de um corrupto lhe dar dinheiro numa milionária defesa é roubar hospitais públicos, o erário público, aposentadorias, escolas, não interessa. Interessa o que o corrupto de alta classe, tem dinheiro para pagar.

Existe sim para eles a preocupação com a legalidade, uma legalidade viciada e corrupta, que custou 20 anos para ser levantada, com os aprendizes de corruptos galgando pouco a pouco as posições mais altas de tribunais, câmaras legislativas, editorias de jornais, para darem a isso tudo o nome de frente de defesa da cidadania, da democracia e outros títulos, que já caíram no meio dessa hipocrisia toda.

Uma frente que só se preocupa com uma coisa: defender-se e defender os que a defendem e se puder, perpetuar-se no poder, mas já vê que até sua existência começa a ruir junto com as palavras de falsidade que usou até hoje para se ocultar atras da capa democrática.

Parabéns aos que se revoltam contra tudo isso, contra esse estado criminal que enfim, não tem mais palavras para se justificar.

Cai a máscara e junto com ela, a tribuna dos corruptos.

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Paradigma

O Ministério Público que queremos e estamos edificando, pois, com férrea determinação e invulgar coragem, não é um Ministério Público acomodado à sombra das estruturas dominantes, acovardado, dócil e complacente com os poderosos, e intransigente e implacável somente com os fracos e débeis. Não é um Ministério Público burocrático, distante, insensível, fechado e recolhido em gabinetes refrigerados. Mas é um Ministério Público vibrante, desbravador, destemido, valente, valoroso, sensível aos movimentos, anseios e necessidades da nação brasileira. É um Ministério Público que caminha lado a lado com o cidadão pacato e honesto, misturando a nossa gente, auscultando os seus anseios, na busca incessante de Justiça Social. É um Ministério Público inflamado de uma ira santa, de uma rebeldia cívica, de uma cólera ética, contra todas as formas de opressão e de injustiça, contra a corrupção e a improbidade, contra os desmandos administrativos, contra a exclusão e a indigência. Um implacável protetor dos valores mais caros da sociedade brasileira. (GIACÓIA, Gilberto. Ministério Público Vocacionado. Revista Justitia, MPSP/APMP, n. 197, jul.-dez. 2007)