A vida só tem um sentido, e o único sentido que a vida tem é quando investimos nossa vida na vida dos outros, ou quando encarnamos a luta dos outros como se ela fosse nossa, a luta do coletivo. Esta é a lida do Promotor de Justiça: lutar pela construção contínua da cidadania e da justiça social. O compromisso primordial do Ministério Público é a transformação, com justiça, da realidade social.



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12 de março de 2008

CPI das escutas telefônicas


O Presidente da Associação Nacional dos Membros do Ministério Público (CONAMP), José Carlos Cosenzo, que participou, no dia 5 de março, da audiência pública na CPI das Escutas Telefônicas da Câmara dos Deputados, teve seu depoimento adiado para uma data ainda indefinida. A Comissão investiga denúncias de grampos em telefones de ministros do STF.

Cosenzo foi convidado pelos deputados que integram a Comissão para participar como expositor e conta, em entrevista para o Instituto de Cultura de Cidadania A Voz do Cidadão, que o adiamento ocorreu apenas por uma questão de horário. Ainda deveriam ser ouvidos os representantes da CONAMP e da Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR), e como havia uma previsão do prolongamento da audiência, o Presidente da CPI, o deputado Marcelo Itagiba (PMDB-RJ), decidiu marcar uma nova data. De acordo com Cosenzo o adiamento foi necessário “principalmente porque os integrantes da CPI entendem ser importantíssimo verificar o entendimento do Ministério Público em relação à matéria”.

A CPI das Escutas Telefônicas Clandestinas foi criada em 23 de outubro de 2007, após reportagem publicada pela revista Veja denunciando a existência de escutas telefônicas monitorando ministros do Supremo Tribunal Federal. Segundo a reportagem, o grampo teria sido executado ilegalmente "pela banda podre" da Polícia Federal. A reportagem afirmava ainda que pelo menos cinco ministros do STF e Sepúlveda Pertence, que se aposentou, se sentem ou já se sentiram monitorados por escutas clandestinas. São eles: Marco Aurélio Mello, Celso de Mello, Gilmar Mendes, Cezar Peluso e Carlos Ayres Britto.

O presidente da CPI afirma que será feita uma radiografia de todo o setor, com foco em três critérios: nas escutas legais, feitas com autorização judicial, em seus procedimentos nas escutas ilegais, tentando identificar quem as pratica (detetives particulares e espiões, entre outros) e nos equipamentos utilizados nas escutas (hardwares e softwares), definindo quem os produz, comercializa, fiscaliza e controla. O presidente da CONAMP acredita que Marcelo Itagiba tenha deixado evidente o interesse em saber se os responsáveis pela concessão de autorizações das escutas telefônicas estariam obedecendo rigorosamente a lei em vigor. Ele também ressalta que essa é uma das CPIs mais importantes da atualidade e acredita que outros escândalos, como o dos cartões corporativos, estejam desviando a atenção de um assunto que mexe com um tema altamente delicado, que é o embate entre a inviolabilidade e a liberdade de imprensa, assunto que foi destaque em todo o Brasil há duas semanas, após a suspensão temporária de 12 cláusulas da Lei de Imprensa.

A respeito de como será o final desta CPI, Cosenzo diz que ainda não é possível fazer uma previsão, porque ainda há um longo caminho a ser percorrido até o final do inquérito, mas ele acredita que “seria bom para a sociedade se ao final se pudesse concluir pela fragilidade do sistema atual, com atualização da legislação, além da efetiva penalização dos que divulgam o teor das gravações realizadas com autorização judicial”. Leia abaixo a entrevista com José Carlos Cosenzo, Presidente do CONAMP, na íntegra:


A Voz do Cidadão: “Quais foram as suas impressões a respeito da audiência ocorrida ontem na CPI das Escutas Telefônicas Clandestinas? Na sua opinião, qual será o resultado desta CPI?”

Cosenzo: “O Presidente da CPI deixou clara a pretensão de encontrar soluções para três pontos: a escuta legal, a escuta ilegal e o comércio de equipamentos utilizados para realização das escutas telefônicas. Além disso, ficou evidente o interesse em saber se realmente os atores jurídicos envolvidos estariam obedecendo rigorosamente a lei vigente. Não é possível ainda, porque restam inúmeras oitivas, saber qual o resultado, mas seria bom para a sociedade se ao final se pudesse concluir pela fragilidade do sistema atual, com atualização da legislação, além da efetiva penalização dos que divulgam o teor das gravações realizadas com autorização judicial.”

VC: “O que o senhor acha do comentário do Presidente da CPI, Marcelo Itagiba, quando ele disse que nem mesmo o judiciário tem, atualmente, noção de quantos grampos legais estão autorizados? Quais seriam as conseqüências disso?”

Cosenzo: “É uma afirmação séria, mas o ilustre deputado preside aquela comissão e tem conhecimento dos fatos, além de ser um policial experiente e que atuou muito tempo naquela área. Este também é um ponto relevante a ser apurado na CPI. Quanto às conseqüências, acho prudente o término das investigações, pois ainda muitos fatos estão sendo apurados. Acho que esta é uma das CPIs mais importantes em desenvolvimento, mas está um pouco ofuscada pelos escândalos atuais, como o dos cartões corporativos.”

VC: “O senhor acredita que há uma banalização das autorizações das escutas telefônicas concedidas pelos juízes? Quais as implicações disso para a sociedade?”

Cosenzo: “Não acredito nessa hipótese. O que acontece realmente é a falta de especialização, de técnicas mais apuradas e uma legislação mais rigorosa. Quando se autoriza uma escuta, quebra-se a regra, que é o direito à inviolabilidade do cidadão. A quebra do sigilo é exceção, mas prevista na lei. O que defendemos há muito tempo é uma legislação que dê segurança à sociedade para garantia do sigilo, da inviolabilidade, mas que tenha um mecanismo apto, seguro e eficaz para combate à criminalidade.”

VC: “O senhor apóia a criação de uma pena pecuniária alta pra inibir a divulgação de escutas telefônicas pelos meios de comunicação, sugerida por Walter Nunes da Silva Júnior? O senhor acha que isso é uma violação dos direitos de privacidade e a imprensa deve ser coibida de divulgar o conteúdo dessas escutas para a população?”

Cosenzo: “Em primeiro lugar, a interceptação de escuta telefônica é importantíssima e deve ser mantida, mas sempre precedida de autorização judicial, ouvido o Ministério Público, e com efetivo acompanhamento dos trabalhos, com rigorosa fiscalização do andamento das diligências. Trata-se de ferramenta indispensável no combate à criminalidade organizada, aliás, cada dia mais organizada. Entretanto, por ser uma medida de exceção ao direito constitucional da inviolabilidade, ela somente deve ocorrer se não for possível a obtenção do resultado através de outra forma de investigação. Em segundo, apoiamos uma pena severa pela divulgação das escutas, seja pelo que a realiza ilegalmente ou quem a obteve e divulgou. Aqui era legal, mas a ilegalidade decorreu da divulgação de um fato que deveria ser mantido em sigilo. Quanto à divulgação pela imprensa, a matéria hoje é controversa, mas entendo ser possível a divulgação com base em lei que regule rigorosamente os excessos e conseqüente responsabilização, pois aqui há o conflito entre o sagrado direito da imprensa livre e a inviolabilidade do cidadão.”

VC: “Na sua opinião, qual seria a alternativa mais viável para obtenção de provas licitas?”

Cosenzo: “Há um anteprojeto elaborado pelo Ministério da Justiça com base em estudo de grandes juristas, que enfrenta a questão. Todavia, é evidente que para a licitude da prova feita através da quebra de sigilo telefônico, há que ser precedida de todas as cautelas, como um razoável conjunto de indícios a autorizar a medida, ouvida do Ministério Público e despacho fundamentado da autoridade policial, e fundamentalmente uma fiscalização rigorosa na colheita da prova. Há que se criar uma ferramenta técnica hábil a possibilitar que a qualquer momento o Ministério Público, destinatário da prova, possa conhecer a forma como ela se desenvolve. O que não é mais tolerável, como ocorre atualmente, é o MP e o judiciário ficarem na dependência da apreciação discricionária da valoração das informações a cargo da autoridade policial. Hoje, a regra é só ter conhecimento depois das diligências feitas.”

VC: “Porque o seu depoimento foi adiado na audiência do último dia 5 de março?”

Cosenzo: “Ante o adiantado da hora e como deveriam ser ouvidos, os representantes da CONAMP e da ANPR, representantes da classe do Ministério Público estadual e federal, e como havia uma previsão do prolongamento da audiência, aliado aos compromissos agendados anteriormente pelos depoentes, o Presidente entendeu conveniente marcar uma nova data com maior disponibilidade de tempo para tal, principalmente porque os integrantes da CPI entendem ser importantíssimo verificar o entendimento do Ministério Público em relação à matéria.”

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O Ministério Público que queremos e estamos edificando, pois, com férrea determinação e invulgar coragem, não é um Ministério Público acomodado à sombra das estruturas dominantes, acovardado, dócil e complacente com os poderosos, e intransigente e implacável somente com os fracos e débeis. Não é um Ministério Público burocrático, distante, insensível, fechado e recolhido em gabinetes refrigerados. Mas é um Ministério Público vibrante, desbravador, destemido, valente, valoroso, sensível aos movimentos, anseios e necessidades da nação brasileira. É um Ministério Público que caminha lado a lado com o cidadão pacato e honesto, misturando a nossa gente, auscultando os seus anseios, na busca incessante de Justiça Social. É um Ministério Público inflamado de uma ira santa, de uma rebeldia cívica, de uma cólera ética, contra todas as formas de opressão e de injustiça, contra a corrupção e a improbidade, contra os desmandos administrativos, contra a exclusão e a indigência. Um implacável protetor dos valores mais caros da sociedade brasileira. (GIACÓIA, Gilberto. Ministério Público Vocacionado. Revista Justitia, MPSP/APMP, n. 197, jul.-dez. 2007)