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15 de maio de 2007

Estudo analisa implicações de megaprojetos de infra-estrutura


Publicação alerta para impactos sócio-ambientais de treze projetos prioritários, previstos na IIRSA e no PAC, em possíveis zonas de conflito.

Quase metade da área das unidades de conservação do país será afetada diretamente por projetos de infra-estrutura nacionais e intercontinentais, a maior parte na Amazônia brasileira. Essa é uma das conclusões de análise inédita da Ong Conservação Internacional (CI-Brasil), lançada no dia 2 de maio, na terceira edição de sua revista eletrônica, Política Ambiental. A publicação, que estará disponível para download no site da CI-Brasil, oferece um panorama das implicações sócio-ambientais dos grandes projetos previstos e em andamento na Iniciativa de Integração Regional Sul-americana (IIRSA) e de obras relacionadas que fazem parte do Plano Plurianual (PPA) e do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) do Governo Federal.

O estudo deteve-se sobre 13 projetos, em desenvolvimento ou já concluídos, que se inserem em áreas fundamentais para a proteção da diversidade biológica no país. Também identifica as zonas de possíveis conflitos nas quais os projetos provocam intensas mudanças no cenário futuro por atuarem sobre regiões relativamente intactas e estarem sobrepostos em várias obras e em locais estratégicos para o escoamento da produção. As áreas afetadas são incipientes em termos de organização social e marcadas pela ausência de governança, sendo precárias a presença efetiva do Estado e a participação das comunidades nos processos decisórios. “Além de alertar para os impactos, o estudo objetiva apontar caminhos para o desenvolvimento regional com sustentabilidade”, explica o diretor de Política Ambiental da CI-Brasil, Paulo Gustavo Prado.

Para avaliar o impacto dos projetos, foi desenvolvida uma análise de território levando em conta as áreas de influência das obras, as unidades de conservação e as chamadas áreas prioritárias para a conservação, recentemente revisadas pelo Ministério do Meio Ambiente. Conforme o estudo, a área total de influência das obras será de 2,5 milhões de quilômetros quadrados, atingindo 137 unidades de conservação, 107 terras indígenas e 484 áreas prioritárias para a conservação da biodiversidade brasileira. Entre os biomas, o mais afetado será a Amazônia. Somente neste domínio, 322 áreas entre as mais ricas em espécies amazônicas estarão expostas a pressões antrópicas.

Dois pesos, duas medidas - Prado ressalta que apesar de os projetos serem planejados em conjunto para a ligação regional e intercontinental, o mesmo não acontece em relação aos impactos, que são vistos sob a ótica pontual de cada obra, como se não tivessem relações entre si na escala regional. Essa fragmentação ocorre ainda no âmbito de cada projeto, dificultando o reconhecimento das implicações ambientais e sociais. Um exemplo foi o parcelamento do EIA/RIMA do Complexo Hidrelétrico do Rio do Madeira, no qual foram omitidas as linhas de transmissão, o que gerou recente ação do Ministério Público com pedido de anulação do licenciamento.

O resultado é outra grave deficiência dos projetos: a falta de estudos e medidas mitigadoras mais amplas. “Não há um plano para conter o desmatamento facilitado pelas rodovias ou para o desenvolvimento das comunidades”, frisa a especialista em Política Ambiental da CI-Brasil, Isabella Freire. No caso do Complexo do Madeira, estima-se que o aumento previsto na produção de soja, decorrente das novas vias de transporte, exija uma área maior do que a região em sua totalidade, pelo menos 400 mil quilômetros quadrados, uma dimensão superior aos estados de São Paulo, Rio de Janeiro e Espírito Santo juntos, aumentando a pressão sobre a floresta amazônica. Prado aponta que isso indica a ocorrência de super-dimensionamentos nos benefícios econômicos de alguns projetos setoriais que justificam as obras.

“É preciso reverter esse quadro, no qual os governos sul-americanos pressionam os financiadores por um tratamento preferencial aos projetos pertencentes à IIRSA, sob a ótica da menor rigidez nas salvaguardas exigidas para sua implementação, sem maiores preocupações com impactos sócio-ambientais ou sustentabilidade regional”, reforça.

Portas abertas à ilegalidade – “O poder público abre caminho via infra-estrutura, abrindo também para a economia da ilegalidade”, alerta Freire, lembrando as conseqüências negativas de fatores como a intensa migração de populações sem atendimento e apoio por parte do Estado, o despreparo de infra-estrutura rural e urbana de saúde, educação e saneamento, a perda de qualidade da água e o desequilíbrio de serviços ambientais. A essa lista, somam-se outros graves impactos sócio-ambientais, como a redução de recursos pesqueiros, aumento indiscriminado de esforço de coleta e caça para a sobrevivência, incremento de áreas desmatadas, prática da grilagem, violência, desemprego, prostituição e incidência de doenças contagiosas. “A governança precisa chegar junto, e até mesmo antes, porque a infra-estrutura sozinha só degrada”, compara.

Exemplos que mostram a rápida perda de recursos naturais e de qualidade de vida numa região sem governança e sob efeito de grandes obras de infra-estrutura são abundantes. Com a fiscalização ainda inoperante, em 2001, o anúncio de asfaltamento da BR 163 atraiu sojicultores de outras regiões. Em 2003, o desmatamento ao longo da rodovia aumentou mais de 150%. A área perdida nesse ano foi equivalente a 76 campos de futebol por dia.

Cenários de sustentabilidade – Pesquisas comprovam como a governança é essencial para garantir a sustentabilidade. Na comparação de cenários com e sem governança na Amazônia, pesquisadores mostram que as perdas florestais caem no primeiro caso, enquanto sobem no segundo. Outros estudos também demonstram a relação direta entre a geração de emprego e renda e manutenção dos estoques de recursos naturais com resultados positivos ou negativos conforme a situação de governança regional.

Na opinião de Prado, a solução passa pelo reconhecimento de experiências de vanguarda, como o Plano BR 163 Sustentável, cuja base do planejamento regional é a participação da sociedade e a prevenção dos impactos sociais e ambientais. “Pelas lições aprendidas, o Brasil está em condições de aprimorar o desenvolvimento pretendido, revertendo o modelo convencional, que coloca a biodiversidade e as populações tradicionais como empecilhos ao desenvolvimento econômico”, frisa. Na prática, a metodologia segue ignorada. Todas as pavimentações na região Amazônica, anunciadas depois da BR 163, ainda desconsideram esses princípios e não possuem um plano de desenvolvimento sustentável.

O conteúdo da revista na íntegra pode ser acessado em:

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