9 de dezembro de 2025

A Cruz de Ferro

 

A Cruz de Ferro, filme dirigido por Sam Peckinpah, exibido nos cinemas em 1977, narra a história de soldados que lutam em condições extremas, enfrentando o caos, a crueldade e o peso esmagador da guerra. A condecoração, a cruz de ferro, simboliza coragem, sacrifício e a disposição de permanecer firme quando tudo ao redor vacila. No Ministério Público, a verdadeira cruz de ferro não é metáfora de guerra, mas de missão institucional, ela se manifesta na responsabilidade de defender a sociedade por meio da ação penal pública, especialmente quando o bem jurídico em jogo é o mais precioso de todos, a vida humana. Esta cruz de ferro encontra sua expressão máxima no Tribunal do Júri, onde Promotores e Promotoras de Justiça assumem a linha de frente da Curadoria da Vida.

O artigo 127 da Constituição Federal consagra o Ministério Público como instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado e responsável pela defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis. Não há interesse mais alto, mais nobre e mais sensível do que o direito à vida. É por isso que é preciso reconhecer a grandeza daqueles que carregam essa missão em plenário. O Promotor do Júri e a Promotora do Júri são guardiões do pacto social que almeja a ordem, paz e justiça, porque dão voz a quem já não pode falar e dão presença a quem foi arrancado da existência pela violência sanguinária.

Atuar no Tribunal do Júri exige honra, compromisso existencial e coragem cívica. Exige preparo técnico, domínio jurídico, mas também integridade ética, inteligência emocional e senso profundo de responsabilidade pública. É no calor do plenário que se revela o compromisso real com o artigo 127 da Constituição Federal, porque ali o Ministério Público se apresenta não como abstração institucional, mas como presença humana, concreta e firme diante dos jurados, buscando justiça em nome da vida que foi ceifada, da sociedade desfalcada e da família enlutada. A Curadoria da Vida é mais do que uma atribuição funcional, é uma convocação à alma e ao espírito.

O Júri é a arena onde se confrontam narrativas sobre a verdade, o valor da vida e a responsabilidade individual. Nenhuma instituição tem tarefa mais sensível. Os Promotores e Promotoras do Júri carregam a cruz de ferro da instituição quando enfrentam as mentiras dos assassinos, as artimanhas da defesa, a pretensa onipotência das organizações criminosas, a impunidade estrutural dos homicídios, quando lutam contra a invisibilidade das vítimas, quando exercem o dever constitucional de conduzir o caso envolvendo crime de sangue com equilíbrio, técnica e firmeza. São eles que asseguram que o processo penal não se torne ritual vazio e que o direito fundamental à vida não seja reduzido a palavra esquecida em texto constitucional.

Por isso, quando falamos na cruz de ferro do Ministério Público, falamos de mulheres e homens, dotados de espírito público, que se levantam, todos os dias, para enfrentar o terreno mais áspero da Justiça criminal, onde cada palavra pesa, cada decisão importa e cada vida perdida clama por resposta. No Tribunal do Júri, o Promotor e a Promotora de Justiça não apenas atuam e falam, eles protegem a sociedade, reafirmam o pacto civilizatório e sustentam, diante da comunidade, que a vida humana é inviolável e, por isso, não pode ser atacada impunemente. São eles que impedem que o silêncio dos túmulos vença a voz da consciência social, que a indiferença substitua a responsabilidade e que a violência se torne rotina. A Curadoria da Vida é a trincheira onde a coragem cívica se converte em serviço público, onde o Ministério Público revela seu caráter mais nobre e onde a justiça, enfim, ganha legitimidade porque é praticada pela fonte primária do poder, o povo.

Por César Danilo Ribeiro de Novais, Promotor de Justiça do Tribunal do Júri, Presidente da Confraria do Júri e autor do livro A Defesa da Vida no Tribunal do Júri (4a ed. - 2025).

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