A
Cruz de Ferro, filme dirigido por Sam Peckinpah, exibido nos cinemas em 1977,
narra a história de soldados que lutam em condições extremas, enfrentando o
caos, a crueldade e o peso esmagador da guerra. A condecoração, a cruz de
ferro, simboliza coragem, sacrifício e a disposição de permanecer firme quando
tudo ao redor vacila. No Ministério Público, a verdadeira cruz de ferro não é
metáfora de guerra, mas de missão institucional, ela se manifesta na
responsabilidade de defender a sociedade por meio da ação penal pública,
especialmente quando o bem jurídico em jogo é o mais precioso de todos, a vida
humana. Esta cruz de ferro encontra sua expressão máxima no Tribunal do Júri, onde
Promotores e Promotoras de Justiça assumem a linha de frente da Curadoria da
Vida.
O
artigo 127 da Constituição Federal consagra o Ministério Público como
instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado e
responsável pela defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos
interesses sociais e individuais indisponíveis. Não há interesse mais alto,
mais nobre e mais sensível do que o direito à vida. É por isso que é preciso reconhecer
a grandeza daqueles que carregam essa missão em plenário. O Promotor do Júri e
a Promotora do Júri são guardiões do pacto social que almeja a ordem, paz e
justiça, porque dão voz a quem já não pode falar e dão presença a quem foi arrancado
da existência pela violência sanguinária.
Atuar
no Tribunal do Júri exige honra, compromisso existencial e coragem cívica.
Exige preparo técnico, domínio jurídico, mas também integridade ética, inteligência
emocional e senso profundo de responsabilidade pública. É no calor do plenário
que se revela o compromisso real com o artigo 127 da Constituição Federal, porque ali o
Ministério Público se apresenta não como abstração institucional, mas como
presença humana, concreta e firme diante dos jurados, buscando justiça em nome
da vida que foi ceifada, da sociedade desfalcada e da família enlutada. A Curadoria da Vida é mais do que uma atribuição
funcional, é uma convocação à alma e ao espírito.
O
Júri é a arena onde se confrontam narrativas sobre a verdade, o valor da vida e
a responsabilidade individual. Nenhuma instituição tem tarefa mais sensível. Os
Promotores e Promotoras do Júri carregam a cruz de ferro da instituição quando
enfrentam as mentiras dos assassinos, as artimanhas da defesa, a pretensa onipotência das organizações
criminosas, a impunidade estrutural dos homicídios, quando lutam contra a
invisibilidade das vítimas, quando exercem o dever constitucional de conduzir o
caso envolvendo crime de sangue com equilíbrio, técnica e firmeza. São eles que
asseguram que o processo penal não se torne ritual vazio e que o direito
fundamental à vida não seja reduzido a palavra esquecida em texto
constitucional.
Por
isso, quando falamos na cruz de ferro do Ministério Público, falamos de mulheres
e homens, dotados de espírito público, que se levantam, todos os dias, para enfrentar o terreno mais áspero
da Justiça criminal, onde cada palavra pesa, cada decisão importa e cada vida
perdida clama por resposta. No Tribunal do Júri, o Promotor e a Promotora de
Justiça não apenas atuam e falam, eles protegem a sociedade, reafirmam o pacto
civilizatório e sustentam, diante da comunidade, que a vida humana é inviolável e, por isso, não pode ser atacada impunemente. São
eles que impedem que o silêncio dos túmulos vença a voz da consciência social, que a
indiferença substitua a responsabilidade e que a violência se torne rotina. A
Curadoria da Vida é a trincheira onde a coragem cívica se converte em serviço
público, onde o Ministério Público revela seu caráter mais nobre e onde a
justiça, enfim, ganha legitimidade porque é praticada pela fonte primária do
poder, o povo.
Por César Danilo Ribeiro de Novais, Promotor de Justiça do Tribunal do Júri, Presidente da Confraria do Júri e autor do livro A Defesa da Vida no Tribunal do Júri (4a ed. - 2025).

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